As preocupações de Macau
A exportação de trabalhadores domésticos para Macau, a exigência de revisão anual das cartas de condução da China e Macau e a alteração à regulamentação do uso da água no Delta das Pérolas. Estas serão algumas das questões levadas a Pequim pelos representantes de Macau junto da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês (CCPCC). A 11ª reunião magna do organismo tem hoje início na capital chinesa.
Leonel Alves, recentemente nomeado para a CCPCC e que terá a sua participação na reunião de hoje, deverá comentar o ponto da situação em termos de legislação de Macau e apresentar sugestões quanto à complementaridade com os diplomas do Continente. Em análise, da parte de Lei Heong Iok, estará a questão da cooperação entre os institutos de educação superior e a China.
Já Ho Iok Tong irá levantar outra questão – a implementação mais rápida de medidas de emergência que visem assegurar o fornecimento de água para Macau.
Dos 34 membros da delegação de Macau à CCPPC, nove são estreantes– dois dos quais são Xu Ze e Xu Shuang, líderes do Gabinete de Ligação ao Governo Central. Os outros sete “estreantes” são Yao Tun Ieong, Wong Pan Seng, Fong Chi Keong, Lei Heong Iok, Lei Kai Meng, Leonel Alves e Leong Heng Teng, oriundos de diferentes sectores de Macau.
O passado mês foi de treino para os políticos, já que tiveram discussões e jantares de orientação com os chamados seniores.
Num jantar que teve lugar no passado fim-de-semana em Pequim, sete dos novos delegados explicaram que irão apresentar moções, comentários e sugestões sobre as questões do território. Leong Heng Teng deverá abordar assuntos directamente relacionados com a cooperação com o Continente. Já Lei Heong Iok e Yao Tun Ieong, ambos ligados ao sector da educação, deverão proferir alguns comentários sobre a cooperação entre os institutos superiores de educação de Macau e o Continente. Por seu turno, Wong Pan Seng irá comentar a migração chinesa para o território e todos os problemas por detrás desta questão. Já Lei Kai Neng, da União Nacional dos Adolescentes, irá levar ao organismo político os assuntos ligados aos jovens e à protecção ambiental. Deverá também apresentar moções sobre a reforma médica e seguro de saúde.
O deputado Leonel Alves foi aquele que mais atraiu a atenção dos órgãos de comunicação social, já que se trata do primeiro macaense na História da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês. O único ponto que tem preocupado alguns dos membros mais velhos, segundo o jornal Ou Mun, é a sua “habilidade no mandarim”, apesar de serem também várias as vozes que asseguram que domina a língua.
Académico de Pequim em Macau para palestra no IIUM
Taiwan, o assunto mais problemático
Taiwan, o assunto mais problemático
Cooperar ao invés de competir. E pensar num desenvolvimento da China que resulte também de um relacionamento pacífico com os restantes países do mundo. Foi o que defendeu o director-geral do Instituto para os Estudos Americanos da Academia de Ciências Sociais Chinesas, Huang Ping, numa conferência no Instituto Inter-Universitário (IIUM) sobre o crescimento sem conflitos do gigante do Oriente. Não deixou, contudo, de nomear o calcanhar de Aquiles: Taiwan.
Um desenvolvimento pacífico e sustentável que resultará da coordenação com outros países do mundo. Aliás, da “aprendizagem” com outros países desenvolvidos. É o caso do Japão – um colaborador importante no que toca às “questões tecnológicas”. Ou mesmo a Índia, que, “apesar de alguns problemas históricos”, poderá ser um importante parceiro para “um melhor desenvolvimento internacional”. Um crescimento “sustentável” que poderá também surgir de um bom relacionamento com o gigante da América do Sul, o Brasil.
De acordo com o académico, há dois tipos de assuntos a ter em conta: por um lado, áreas tradicionais como a paz, a guerra e os direitos humanos; por outro, novas questões como o ambiente e o desenvolvimento sustentável. Assuntos que se “encontram em igual grau de importância”.
Há questões internas que têm também de ser “resolvidas”, na opinião do académico. “A China ainda tem uma grande taxa de desemprego”, declarou. Além disso, a população está a sofrer um envelhecimento “mais rápido do que o desenvolvimento económico”, desviando a atenção para problemáticas como a assistência médica, a segurança social e a reforma. O académico defende ainda que se deve prestar atenção aos “conflitos dentro da própria China”. Taiwan foi um dos exemplos dados. Mesmo assim, “os períodos de paz têm sido mais longos do que os de guerra”, vincou.
A cooperação com os outros países é importante, tendo em conta o contexto em que a China actualmente se insere. “Os chineses já reconhecem a importância do primado da lei e da melhor governação”, estando o país na senda de “um desenvolvimento mais abrangente, equilibrado e sustentável”. “Dado o tamanho e o ritmo de crescimento, se a China crescer bem, o mundo irá beneficiar – se houver, por exemplo, uma crise ambiental, todos irão sofrer”, acrescentou. Uma relação com os restantes países que também deverá ter em conta o equilíbrio entre os tradicionais valores chineses e os chamados “direitos emergentes” do Ocidente.
Os novos desafios vêm de longe: do continente africano. Tendo já há muito tempo “relações tradicionais” com África – que continuam a florescer -, há que ter em conta os novos tempos e a necessidade de “outras políticas”.
Luciana Leitão
Ao Man Long vai estar hoje no Tribunal Judicial de Base
O antigo secretário para os Transportes e Obras Públicas, Ao Man Long, vai hoje ao Tribunal Judicial de Base (TJB) na qualidade de testemunha do processo que tem como arguidos quatro familiares seus e três empresários de Macau. Será a primeira aparição em público do antigo governante depois da sua condenação a 27 anos de prisão por crimes de corrupção passiva e de branqueamento de capitais, a 30 de Janeiro último, que está a cumprir no Estabelecimento Prisional de Coloane.
Existe bastante expectativa em relação ao depoimento de Ao Man Long, uma vez que, aquando do julgamento que decorreu no Tribunal de Última Instância, em que foi o único arguido, se recusou a explicar o envolvimento dos familiares, acusados e a serem julgados no processo conexo que decorre agora no TJB. Na altura, Ao Man Long limitou-se a dizer que a família não tinha conhecimento de nada, tendo depois optado por permanecer em silêncio quando foi questionado sobre os montantes depositados em contas abertas em Hong Kong e no Reino Unido pelos seus familiares.
Recorde-se que são arguidos no presente processo o pai, irmão, cunhada e mulher de Ao Man Long (esta última a ser julgada à revelia e procurada pelas autoridades policiais internacionais), bem como os empresários Frederico Nolasco da Silva, Ho Meng Fai (também em parte incerta) e Chan Tong Sang. Os familiares do antigo secretário são acusados de o terem ajudado a abrir contas bancárias fora de Macau, num processo de branqueamento de capitais. Na primeira audiência do julgamento, tanto o pai como o irmão e a cunhada asseguraram não ter conhecimento da finalidade efectiva da abertura das contas bancárias das quais eram titulares.
O pai, que tem mais de 80 anos, explicou que foi aos bancos de Hong Kong a pedido do filho, não se tendo atrevido a questioná-lo sobre o assunto devido ao seu feitio. “Não gostava de ser questionado”, disse. Quanto ao irmão e à cunhada, abriram contas no Reino Unido, por sugestão e com a ajuda de Ao, por estarem a pensar pôr o seu filho a estudar no país.
Isabel Castro
“Misturar a arte da cozinha com a arte da pintura, da gravura e do vídeo.” É este o objectivo da exposição “Primavera” que estará patente na Galeria La Bonne Heure até ao dia 15 deste mês. Em pleno coração do Largo do Leal Senado, 12 artistas locais forraram as paredes do restaurante francês com obras suas. As temáticas dos trabalhos não têm uma ligação entre si, mas a iniciativa faz parte de um projecto que tem um propósito nobre: reconciliar o público com a arte que se faz em Macau.
“Se a montanha não vai a Maomé, Maomé vai à montanha”, frisou o artista dinamizador da exposição, Joaquim Francisco, mais conhecido na praça por Franco. “Numa galeria pequena, ninguém aparecia. Assim, a arte chega às pessoas. Esta exposição pretende trazer a arte para fora dos ateliers”, acrescentou.
O conceito de “arte ao jantar” foi criado no ano passado, altura em que se organizaram sete mostras. Para 2008, está também programado o mesmo número de exposições. Contudo, ainda não há uma calendarização definida. Sabe-se apenas que poderão ser iniciativas conjuntas ou individuais. A primeira do ano foi intitulada “Primavera”, embora os trabalhos dos artistas não obedeçam ao tema. Porquê então esta escolha temática?
“É dedicada à cultura chinesa e à época que foi agora celebrada. Como a exposição foi inaugurada logo após ao Ano Novo chinês, achámos que este seria o título adequado”, explicou Franco.
Frank Lei, Yuphin Srijatturant, Monica Stroscia, Joaquim Franco, Stephane Ferrero, Gretchen Ettlei, Gigi Lee, Luís Oliveira, Debby Sou, Joey Ho, José Drummond e Hsing-lung Lai são os artistas convidados para a mostra primaveril. O critério essencial da escolha dos participantes foi a qualidade.
“Convidámos uma lista de artistas que dessem alguma garantia de qualidade e seriedade ao projecto. Em segundo lugar, demos-lhes toda a liberdade para apresentarem os seus trabalhos”, sublinhou.
Quem se deslocar ao restaurante La Bonne Heure sentar-se-á à mesa rodeado de pequenas grandes obras. Cada uma, criada por um artista com uma vivência distinta. Cada trabalho tem uma história diferente.
O “Sem Título” pintando em acrílico por Luís Oliveira é uma das primeiras telas que se encontra à entrada da galeria. Ainda “a dar os primeiros passos” no mundo artístico, o arquitecto decidiu expor o seu trabalho mais recente.
A pintura inspirada no artista norte-americano Marc Rothko “afasta-se plasticamente” daquilo que Luís Oliveira faz “naturalmente”. “Foi um acto pensado”, realçou. Servindo-se das cores mais escuras, o artista tentou “representar uma emoção, dizendo o máximo com o mínimo de elementos”.
Ali próximo, pendurado nas paredes brancas e rugosas da galeria, ladeado pelos trabalhos dos companheiros, está o quadro de Yuphin Srijatturant. Combinando três técnicas, como a impressão, a decapagem e as aguarelas, a artista tailandesa criou “Chang of Living”. A pequena peça mostra um rosto humano cujas cores dominantes são o vermelho e os vários tons de cinzento.
Gretchen Ettlei apresenta um trabalho que se destaca pela técnica utilizada. A artista costurou vários quadrados semelhantes de papel.
Um pouco mais à frente, encontra-se a gravura assinada por Franco. “Bela Vista” representa a Macau de 1992. “Escolhi esta peça, porque tem muita qualidade e foi pouco mostrada. Além disso, mostra uma Macau que já não existe”, salientou o autor.
A contrastar com os cinzentos do quadro do artista português está logo de seguida o “Beloved” de Gigi Lee. Embora não seja um acto propositado, a rosa azul pintada segundo as tradicionais técnicas chinesas em papel enrugado é o único trabalho que lembra a estação do ano das flores.
“Neste trabalho, tentei usar materiais e técnicas diferentes. Apesar de ser criado segundo uma prática tradicionalmente chinesa, não queria que as pessoas vissem este trabalho como sendo apenas chinês. A minha intenção foi dotar esta obra de um carácter mais contemporâneo”, apontou a artista local.
A exposição “Primavera” marcou ainda a estreia em Macau da artista italiana Monica Stroscia com a obra “Figura de Inverno”. Na segunda sala do restaurante que está preenchida com trabalhos dos artistas locais, a representação de uma mulher destaca-se pela dimensão. O desenho a carvão é o maior quadro da exposição, ocupando sozinho uma das paredes da sala.
A história da criação da “Figura de Inverno” está colada a um período específico da vida da artista. A escolha para a exposição foi feita pelos restantes artistas do grupo.
“Não estava bem, estava sozinha em casa, sentia-me muito vazia e pensava em deixar Macau. Procurava alguma coisa e foi o que me saiu”, explicou. No fundo, o trabalho é um esboço, “uma preparação para algo”, notou. Monica Stroscia é arquitecta de profissão e tem formação em arte desde a juventude. Macau é a sua casa há três anos.
Na mesma sala, destaca-se o colorido trabalho de Debby Sou. “Skyline” confere uma lufada de ar fresco à mostra com as suas tonalidades azuis, vermelhas, laranja e amarelas.
A arte da fotografia e do vídeo também ocupam um lugar na mostra de Primavera. Frank Lei, director artístico do grupo Armazém do Boi, participa na iniciativa com duas fotografias sem título.
A tela escolhida por José Drummond é diferente das demais. Em vez de óleo, aguarelas ou acrílico, o artista português faz a diferença com a arte do vídeo.
“Mestre do Desejo” surge na sequência de dois trabalhos já apresentados noutras ocasiões ao longo do ano passado. “Achei que neste tipo de iniciativa havia espaço para o vídeo, que continua a ser o patinho feio da arte”, defendeu.
As imagens mostram-nos uma mão a escrever uma “carta de amor” em verso, que acaba por assumir a forma de um coração. À medida que vai sendo escrito, o texto acaba por chegar a um ponto caótico, em que a única coisa perceptível são palavras isoladas, perdendo-se o sentido do poema.
“Este trabalho é sobre a ansiedade e dúvida que residem em cada um de nós em relação à nossa solidão ou incapacidade cada vez mais constante do Homem de se dar mais profundamente com o outro. A ânsia geralmente resulta em caos”, contextualizou.
Até o dia 15 deste mês o vídeo assinado por José Drummond e as restantes 11 obras de artistas locais vão estar expostas no restaurante La Bonne Heure.
Arte de Macau estagnada?
O “boom” económico trazido pela liberalização do jogo reflecte-se na vida artística de Macau? Esta foi a pergunta colocada aos cinco artistas locais presentes na inauguração da exposição “Primavera” que está patente no La Bonne Heure. A resposta foi quase unânime: em vez de melhorar, a arte que se faz na RAEM piorou ou pura e simplesmente estagnou. As razões apontadas divergem.
Para José Drummond, o estado da arte do território “não mudou nada”. “Poderia ter tendência a piorar, basta olhar para a parte de fora dos casinos para saber o que está dentro”, ironizou.
Las Vegas, actualmente a segunda maior cidade da indústria do jogo, ao contrário de Macau, destaca-se pelo número de galerias de arte. No território, a situação é inversa. São poucas as operadoras de jogo que investem e patrocinam artistas locais.
“Se pensamos que os casinos podem promover a arte, temos que continuar à espera”, acrescentou José Drummond. Se algo mudou após com o rápido crescimento económico da RAEM foi o afluxo de novas pessoas e artistas, notou. Segundo o artista português, é a “energia destas pessoas” que alimenta a esperança num futuro mais promissor para a arte de Macau.
“A iniciativa artística no território passa por projectos individuais. Há algum investimento de algumas partes, mas não é toda a gente abrangida.” A análise é feita por Luís Oliveira, arquitecto e artista local. O importante a reter é, acrescentou, que estão a fazer-se tentativas para explorar outras perspectivas.
O problema que impede a arte local de ir mais além, segundo Monica Stroscia, é a falta de cooperação entre os artistas. A arquitecta e artista italiana residente em Macau há três anos considera que há demasiada competição no mundo artístico da RAEM. “É preciso que as pessoas trabalhem em conjunto”, sustentou.
A perspectiva de Gigi Lee é distinta dos companheiros. “Vivo há quase uma vida em Macau. Esta terra mudou muito, tornando-se um bom lugar para desenvolver actividades artísticas. O facto de ser pequeno é vantajoso, porque assim é fácil conhecer outros artistas”, frisou.
Já para Joaquim Francisco, “não se pode pensar que o ‘boom’ dos casinos tenha trazido alguma mudança”. Pelo contrário, defendeu o artista residente em Macau há 18 anos, antes havia mais actividades culturais e as pessoas mostravam mais interesse. “Actualmente, há um desinteresse total.”
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