Macau entra com 15 por cento
Os Governos envolvidos no projecto da Ponte do Delta já acordaram uma percentagem de financiamento da ponte que vai ligar Hong Kong, Macau e Zhuhai, cabendo à RAEM perto de 15 por cento do bolo, e a Hong Kong metade. Os investidores privados serão convidados a partilhar o fardo.
A secretária para os Transportes e Habitação de Hong Kong, Eva Cheng, confirmou ontem a abertura ao investimento depois de o grupo de coordenação terminar a última reunião. Aos Governos de Hong Kong, Guangdong e Macau caberá 50, 35 e 15 por cento, respectivamente, dos custos remanescentes. Uma percentagem definida de acordo com o benefício que advirá para cada uma das partes.
Quanto ao montante exacto de financiamento que será exigido a cada um dos Executivos, tal irá depender de quanto os investidores estão dispostos a financiar. “Esperamos que os subsídios possam ser tão pequenos quanto possível, dada o lançamento de concurso”, afirmou Cheng. Mas recusou-se a revelar o custo exacto da ponte, de forma a não afectar o processo de licitação. Gordon Wu, da empresa Hopewell, e o patrão da STDM, Stanley Ho, já confirmaram publicamente ter interesse em investir na ponte. Estima-se que a travessia custe mais de 30 mil milhões de yuan.
Os relatórios sugerem que o grupo de trabalho irá estabelecer um escritório comum para lançar trabalhos preparatórios da submissão a concurso, que incluirão o recrutamento de um consultor.
Aliás, os consultores do Instituto de Planeamento e Design das Auto-Estradas deverão analisar o fluxo de trânsito da ponte, de forma a averiguar a acessibilidade de uma vasta quantidade de veículos. Cheng afirmou ainda que já está provado que o projecto é financeiramente viável, apesar de ainda faltar um acordo no controlo de tráfego.
Os três Governos deverão unir esforços na principal estrada de ligação, enquanto as estradas complementares deverão ser construídas por cada uma dos partes envolvidas. Um túnel de 6,7 quilómetros deverá ser construído, de forma a permitir a circulação entre os portos de Cantão e Shenzhen. De acordo com estudos realizados, as empresas de construção chinesas deverão liderar os trabalhos, mas uma “joint-venture” com uma empresa estrangeira não está posta de parte. A auto-estrada terá três faixas de duplo sentido, e a velocidade máxima será de 100 km/hora.
Já se passaram 20 anos desde o início da discussão formal da ponte e o seu financiamento foi considerado um dos maiores obstáculos. Mas, quando inquirida pelos repórteres se teriam ocorrido dificuldades na negociação, Eva Cheng riu e afirmou: “Parece-me que com a cooperação dos três Governos não temos obstáculos.”
Kahon Chan, em Hong Kong
É um programa que nitidamente aposta nos talentos locais e no público residente, embora o Instituto Cultural (IC) pretenda atrair (também) visitantes de outros pontos para as plateias da 19ª edição do Festival de Artes de Macau (FAM). Heidi Ho, presidente do Instituto Cultural, refuta que a organização esteja a retirar o carácter internacional ao FAM e a vinda de grupos de Israel, da Coreia do Sul e da Índia são exemplo que se trata de uma oportunidade para a população de Macau poder ter contacto com outras formas de expressão artística. “Não há mais espectáculos locais do que nas edições anteriores”, disse.
Numa “clara aposta no talento e nas produções locais”, mais de metade dos 17 espectáculos que poderão ser vistos entre 1 e 30 de Maio nas várias salas da cidade são da responsabilidade de formações do território. Da ópera cantonense ao bailado, a cargo dos alunos da Escola de Dança do Conservatório de Macau, vai ser possível ficar com uma noção do estado das artes performativas da RAEM.
As orquestras sob a alçada do Instituto Cultural – a de formação de câmara alargada e a de instrumentos chineses – têm também presença assegurada no FAM. No pequeno auditório do Centro Cultural de Macau vai actuar ainda o grupo Dóci Papiáçam di Macau, sendo que o teatro em patuá desempenhará o papel de intervenção que as artes (também) desempenham. Miguel Senna Fernandes, responsável pelo grupo, explicou ontem que a peça “Doce Sorte”, a apresentar no FAM, versará sobre o crescimento de Macau no contexto dos casinos.
De fora da edição deste ano do festival ficam grandes nomes das artes internacionais, excepção feita ao violinista Pinchas Zukerman, cuja vinda a Macau já era conhecida, anunciada aquando da divulgação da actual temporada da Orquestra de Macau. Talvez seja Zukerman a cabeça de cartaz de um festival cada vez mais difícil de comparar com o homólogo de Hong Kong. Macau não vai ser presenteado, por exemplo, com um bailado coreografado por Pina Bausch, que os residentes da antiga colónia britânica podem ver este fim-de-semana.
Mas a verdade é que, no que toca à eleição do chamado cabeça de cartaz, o Instituto Cultural parece não ter grandes preocupações em apostar num grande nome como forma de atrair público e projectar o festival. É que, segundo explicou Heidi Ho, “todos os espectáculos são importantes, sejam eles em recinto coberto ou ao ar livre”. A declaração da presidente do IC foi feita em jeito de justificação para o facto de o único grupo português ter a actuação agendada para o Jardim Iao Hon.
É que, ao contrário do que tem vindo a ser prática desde o estabelecimento da RAEM, nenhum nome sonante da música portuguesa vai pisar o palco do Centro Cultural ou partilhar a noite com a Orquestra Chinesa de Macau. A aposta parece vir na continuidade do que já foi ensaiado no ano passado – o Instituto Cultural traz a Macau nomes pouco conhecidos do espectro musical português. Na edição de 2007, foram os “O’queStrada”. Para Maio próximo foram convidados os “Uxu Kalhus”.
Para quem não conhece o grupo que aposta em sons populares, fica a referência da acordeonista Celina Piedade, principal dinamizadora da formação, que já por cá passou ao lado de Rodrigo Leão. Questionada acerca do critério de escolha do IC, Heidi Ho foi evasiva: “Nesta edição, tentámos ser diferentes das edições anteriores.” E mais não disse. A vinda dos “Uxu Kalhus” não é mencionada sequer no programa que ontem foi distribuído à imprensa.
Parecem ser assim cada vez mais históricas presenças como a de Vitorino, que actuou há dois anos no Centro Cultural. Na mesma edição do FAM, a Ala dos Namorados fez um concerto em parceria com a Orquestra Chinesa de Macau. No festival deste ano não haverá lugar a fusões musicais entre Oriente e Ocidente.
No ano passado, a comunidade que não domina o cantonês teve dificuldade em perceber parte dos espectáculos oferecidos pelo FAM, por falta de legendagem. No programa ontem distribuído, as únicas referências feitas à matéria indicavam legendas em chinês e em inglês, nalguns espectáculos. No entanto, este ano, garantiu Heidi Ho - questionada várias vezes sobre a existência de legendagem em português - , o problema será resolvido atempadamente. “Ainda tentámos [no ano passado] fazer legendas em português. Não há falta de consideração pela comunidade portuguesa”, assegurou a principal responsável pela organização do Festival de Artes, que este ano conta com um orçamento de 9,5 milhões de patacas.
Na sequência desta garantia dada por Heidi Ho, a presidente do Instituto Cultural foi confrontada com o facto de, ao contrário da imprensa de língua chinesa, a imprensa em língua portuguesa não ter tido conhecimento oficial da deslocação recente a Pequim da Orquestra de Macau. Heidi Ho começou por justificar que se tratou de uma iniciativa de um jornalista, mas confrontada com a existência de uma informação oficial sobre o assunto à imprensa em língua chinesa, acabou por prometer que vai averiguar as circunstâncias do ocorrido.
Ainda sobre o FAM deste ano, a presidente do IC afirmou que os artistas convidados são todos de “nível internacional”.
Isabel Castro
O que há para ver
The Aluminum Show (Israel) 1 e 2 de Maio, no Centro Cultural de Macau – Grande Auditório, às 20h00
Orquestra de Macau – Ciclo de Música de Câmara Imagens de Inglaterra 3 de Maio, no Teatro Dom Pedro V, às 20h00
Noridan (Coreia do Sul) - “Pingpangpong: Noridan Episode 5 De 3 a 5 de Maio, no Teatro Clementina Leitão Ho Brito, às 20h00
Orquestra Chinesa de Macau - Concerto para Piano “O Rio Amarelo”, com o violinista Li Chuan Yun e o pianista Yin Chengzong.
4 de Maio, no Teatro Dom Pedro V, às 20h00
Pallavi Krishnan – Dança Clássica Indiana Mohiniyattam (Índia) De 9 a 12 de Maio, na Casa de Lou Kau, às 20h00
Grupo de Teatro Dóci Papiáçam di Macau - Sórti Dóci (Doce Sorte) 10 de Maio, às 20h00, e 11 de Maio, às 16h00, no Centro Cultural de Macau – Pequeno Auditório
Escola de Dança do Conservatório de Macau - Um Jardim no Coração
10 e 11 de Maio, no Centro Cultural de Macau – Grande Auditório, às 20h00
Orquestra de Macau - Ciclo Grandes Mestres, com o violonista Pinchas Zukerman
16 de Maio, no Centro Cultural de Macau – Grande Auditório, às 20h00
Sensorama – Experiências Multiperceptuais (México) - Os Quatro Elementos: Cantos Nativos
De 16 a 18 de Maio e de 20 a 25, na Casa de Lou Kau, às 20h00
Espectáculos ao Ar Livre - Programa a anunciar
De 16 a 18 de Maio, 24 e 25, no Jardim Iao Hon, às 18h00 e às 20:00
Orquestra de Macau – Ciclo de Música de Câmara Deutsche Selektion, com Pinchas Zukerman
17 de Maio, no Teatro Dom Pedro V, às 20h00 horas
Companhia de Ópera Wu da Província de Zhejiang - A Lenda da Cobra Branca
18 de Maio, no Cinema Alegria, às 20h00
A Tempestade por William Shakespeare - 4D art (Canadá)
23 e 24 de Maio, no Centro Cultural de Macau – Grande Auditório, às 20h00
Associação Geral de Ópera e Música Chinesa de Macau - A Travessia (Ópera cantonense)
24 e 25 de Maio, no Cinema Alegria, às 20h00
Nederlands Dans Theatre II (Holanda) - Sleepless
27 de Maio, no Centro Cultural de Macau - Grande Auditório, às 20h00
Associação de Artes Pequena Montanha - A Pedra Mágica (Teatro infantil)
29 e 30 de Maio, no Centro Cultural de Macau – Pequeno Auditório, às 20h00
Nuevo Ballet Español (Espanha) - Sangre Flamenca
29 e 30 de Maio, no Centro Cultural de Macau - Grande Auditório, às 20h00
Directores Artísticos: Ángel Rojas e Carlos
A deusa Kun Iam abre o cofre
A festa Kun Iam Hoi Fu realiza-se no 26º dia do primeiro mês do calendário lunar. Este ano acontece entre 2 e 3 de Março de 2008, já que o dia lunar começa às 23 horas. A deusa Kun Iam abre nesse dia os cofres no templo Kun Iam Tong de Macau, para que os devotos venham pedir-lhe empréstimos de fortuna.
Existem em Macau vários templos dedicados a Kun Iam (Guanyin em mandarim) mas é ao mais antigo, o Kun Iam Tong situado na rua Coronel Mesquita, que muitos dos devotos desta divindade se dirigem na noite do dia 2. Há as horas mais propícias para fazer esta visita, quando os devotos apontam para entrar no templo, que este ano serão entre a 1 e as 7 da manhã e das 13 às 15 horas.
Os crentes levam duas peças de três diferentes tipos de fruta, mais pivetes (os paus de incenso) e um enorme maço de dinheiro ou lingotes de ouro e prata para defuntos, assim como um moinho de vento e flores. Crê-se que quem assim procede terá a compensação de ver o seu negócio prosperar durante todo o ano.
A História do culto da divindade Kun Iam em Macau remonta ao século XIII, no tempo da dinastia Yuan, mas é na dinastia Ming que sai da lenda e fica registada com datas.
Um dia, estando duas crianças a pastar algumas cabras, junto ao sopé da colina de Mong Há, encontraram a boiar num dos ramos do rio Xi, próximo da margem, uma imagem de madeira da deusa Kun Iam. Naquele tempo a vertente Oeste da colina encontrava-se junto à água. Desde então, os habitantes tornaram-se devotos da deusa da Misericórdia e fizeram-lhe um nicho, que hoje é o Antigo Templo de Kun Iam, inserido no Kun Iam Tong. Muitos dos actuais edifícios datam de 1627, como se pode ver por uma data gravada num dos altares de pedra, sendo o templo ampliado em 1867.
Não se sabe a origem desta festa e quando começou, mas é estranho não encontrar, após percorrer na biblioteca as estantes referentes à cidade, nenhuma descrição feita pelos muitos que registaram o quotidiano de Macau. Perguntando, não houve ninguém no templo que nos soubesse desfazer esta dúvida, mas lá nos vão dizendo ser uma festa recente e apenas celebrada em Macau e Hong Kong.
São dez e meia da noite e já um grande número de pessoas espera em fila, num serpentear ordenado ao longo das grades colocadas junto à entrada do templo. Olhamos para o grande portão preto e só entram tantos como os que saem. Após uma espera de longos minutos, chegamos ao átrio onde, logo à entrada, quatro enormes estátuas representam os reis-guardiões que protegem o templo das influência do mal. Muitos são já os sacos plásticos, que serviram para transportar aquela parafernália necessária ao culto, a encher os cestos do lixo. Nas partes altas das paredes dos edifícios do átrio, frisos de esculturas em porcelana levam a nossa atenção.
Como nos encontramos num templo budista devemos caminhar no sentido dos ponteiros do relógio. Ao entrar para o primeiro pavilhão, o circular torna-se bastante difícil.
Os pivetes acesos no incensório da entrada são elevados ao nível da cabeça e com uma vénia colocados em cada um dos três altares, dispostos em cada um dos três pavilhões. No primeiro pavilhão encontramos o altar aos Três Budas Preciosos, o segundo é dedicado ao Buda da Longevidade, onde no pátio um dragão a sair da parede se encontra por detrás do incensório. No terceiro pavilhão, o altar à deusa Kun Iam e a ladear, duas vitrines cheias de outras divindades. Também em cada lado da sala existem nove imagens de Budas, tendo uma das séries a companhia de uma estátua de Kun Iam, que nesse dia se encontra com a cabeça tapada por um tecido vermelho. Como a deusa tem diferentes representações e esta tem uma jarra na mão esquerda e a mão direita levantada, pensamos ser por isso que está tapada. Assim para esta festa, como Kun Iam pretende satisfazer todos os desejos, é a representada com uma pérola que é a exposta.
O fumo e cheiro dos pivetes eleva-se ao Céu, com os pedidos e desejos dos milhares de crentes que enchem completamente as várias zonas do templo, sobretudo no terceiro pavilhão. No altar, Kun Iam sentada sobre uma flor de lotus, símbolo de pureza para os budistas, tem um toucado a coroar a cabeça e está vestida com um manto branco de seda bordada, que não permite ver as mãos pousadas no regaço com uma pérola. Aí os crentes recebem um envelope vermelho com o empréstimo, representado por uma moeda antiga chinesa, com o centro aberto em quadrado.
No regresso, ao passar pelo segundo pavilhão os devotos tocam o gongo e no pavilhão seguinte batem no tambor por três vezes.
Por fim chega a altura de atirar para o forno o dinheiro-papel dos defuntos, que arde em altas labaredas, após se fazer três vénias com o tronco e cabeça, encerrando o cerimonial de cada um dos crentes.
Estes são os primeiros passos de uma série de rituais praticados tanto por budistas como por tauistas, que têm Kun Iam como sua divindade.
Assim no 26º dia do primeiro mês do ano lunar, os devotos de Kun Iam dirigem-se ao templo desta deusa pois, todos os anos por um dia, põe à disposição o cofre para que se possa pedir empréstimos de fortuna.
Mas passados onze meses, também no vigésimo sexto dia lunar, para que a deusa atenda de novo as preces, deve o devoto voltar ao templo e repôr o empréstimo pedido.
José Simões Morais
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