quinta-feira, 6 de março de 2008

Venetian cria primeira videoteca do território, Grupo de Macau quer criar centro comunitário em Timor-Leste

Venetian cria primeira videoteca do território

O casino que quer registar Macau

São 1200 horas de imagens. Registos do Venetian, de Macau e do impacto da construção do maior hotel-casino do mundo no território assinalados num arquivo. O objectivo é compilar o nascimento da COTAI strip e as transformações que ocorrem em Macau. Um projecto pioneiro, levado a cabo pelo departamento de “Visual Media” do Venetian, explicado ao Tai Chung Pou pelo director Oren Medicks.
Durante cinco minutos, vêem-se imagens consecutivas da rapidez de construção do Venetian. O resultado foi um prémio atribuído esta semana num festival de Berlim pela “criatividade e tecnologia”. É apenas um exemplo daquilo de que se encarrega o departamento de Visual Media do hotel-resort. Mas o projecto principal, a par da produção de imagem, passa pela criação de uma espécie de “biblioteca”.
O antigo editor de imagem Oren Medicks conhece bem a “frustração de ter muito material espalhado em caixas”. Decidiu, por isso, aceitar o projecto de construção de uma videoteca que “causaria inveja”. Até ao momento, são 1200 horas registadas, guardadas num arquivo informático, de fácil acesso. “Produzimos e acumulamos nesta biblioteca – é útil para as nossas produções futuras.”
A componente de produção passa pela gravação de imagens que podem ser trabalhadas em anúncios de televisão ou documentários. “Por exemplo, neste momento estamos a fazer um anúncio para um spa do Sands. Se o spa do Venetian precisasse de um anúncio, poderíamos facilmente utilizar parte do material, juntar novo e em dois dias teríamos um anúncio lindo.” Quem fala de anúncios publicitários, refere-se também a programas de relações públicas, de formação, ou documentários sobre a “construção da COTAI strip”. A imagem não pode ser negligenciada, cabendo a este departamento “aproximar o povo das pessoas que dão a cara pelo resort”.
Estão também a ser realizadas várias entrevistas. Podem ser académicos, pessoas ligadas à história de Macau ou o cidadão comum. Desde que tenham algo a dizer. Alguns nomes surgem “apenas por curiosidade - conheço pessoas e vejo o que são, peço também à equipa para fazer inquéritos de rua, para ver o que vai mudando, como as ruas vão mudando”.
O arquivo de imagens “está, de certa forma, aberto ao público”, através dos meios de comunicação social que, precisando, podem contactar o Venetian. “É material que contém vídeo, fotos e imagens aéreas”, que interessa, sobretudo, aos profissionais da comunicação social. Pelo menos, na opinião de Oren Medicks.
Com a conclusão da COTAI strip, estará o trabalho do departamento condenado ao fim? Oren acha que ainda irá “crescer”. “Estamos a documentar Singapura e tudo o que acontece na esfera da Las Vegas Sands Corporation.”
Ao longo deste período de trabalho, o responsável chegou a uma conclusão. Macau está em “choque”. “Vê-se” na cara das pessoas que entram no edifício. Pelo espanto marcado na face. “Até as pessoas de Hong Kong estão chocadas, já para não falar dos indivíduos do Continente”, diz. Aliás, as próprias pessoas envolvidas no projecto, estão “espantadas”. A reacção do público não é de estranhar. “O choque não vai diminuir – estão a dirigir-se para um futuro incontrolável, uma grande onda está a invadir Macau”, conclui.
As mudanças serão notórias, na opinião de Oren. “O padrão de vida de Macau vai melhorar”, declara. Segundo o antigo editor de imagem, o que está a acontecer é que a “COTAI strip está a incorporar Macau”. O que, na sua opinião, contradiz aquilo que podia ser visto como a “arrogância norte-americana”. No fundo, é “uma lição do Venetian e do Las Vegas Sands”.
Aliás, não há que temer a mudança porque tudo está a ser feito de “uma forma cuidadosa”. “Há muito mais comunicação com Macau. É interessante ver”, diz. Um sinal disso é que “todos os funcionários do departamento são chineses – alguns de Hong Kong, outros de Macau”, o que “dá uma visão diferente à documentação”. O objectivo, vincou, é “ver o que está a acontecer no território com estas mudanças”. Porque a RAEM está a mudar, fruto de “uma decisão de Macau em abrir ao mundo, diversificar, olhar para economia, trazer entretenimento”. Não foram os americanos que decidiram mudar Macau, sublinhou.
Quando a COTAI strip estiver concluída, espera alguma “esperteza”. Oren Medicks espera que “Macau antigo” seja conservado como parte da História, da identidade. “Quero que Macau seja mais esperto do que Hong Kong em preservar a História”, diz. “Espero que Coloane seja preservado”, remata.
Quanto ao arquivo, a sua existência ainda é relativamente desconhecida do público. “Não vou dizer que sou o perito mundial em publicitar, mas há cada vez mais pessoas a saber”, acrescenta. Com a dificuldade em obter certas imagens, os meios de comunicação social de todos o mundo já têm “pedido registos que não conseguem obter de outra forma”.
Basta inserir um “termo para pesquisa” e aparece no ecrã do computador toda a documentação relativa a esse mesmo dado – o que engloba imagens e “transcrições de entrevistas”. Um arquivo imenso que apenas está disponível para quem contactar a equipa do Venetian.
Os “historiadores oficiais” do desenvolvimento de Macau

Em 2002, quando o Las Vegas Sands Corporation começou a operar em Macau, Daniel Raviv, o conselheiro especial do presidente da empresa, Sheldon Adelson, “conhecia a magnitude da visão, sabia que era difícil para as pessoas aperceberem-se exactamente da dimensão”. Pensou, imediatamente, que “assim que a visão de Adelson tomasse forma, as pessoas esquecer-se-iam como era antes”.
Daniel Raviv foi correspondente internacional durante vários anos e percorreu o mundo. “Não queria estar numa situação em que um produtor se sentasse a meu lado e me dissesse: Dani, é uma grande história, só é pena que não tivéssemos documentado o início”, pensou na altura. Foi então que decidiu começar a “documentar” a situação, para deixar um registo para “os anos vindouros”. Como Daniel Raviv não está sediado em Macau, a ideia seria “enviar o material para o Oren que, durante muitos anos, foi editor de imagem”.
Da ideia da documentação à construção de um arquivo de imagens foi um passo. “Somos os historiadores oficiais do desenvolvimento de Macau”, diz. Mas a grande história será “quando forem feitas todas as filmagens da Cotai strip”. Trata-se do “maior investimento de sempre da indústria do turismo”. Macau será o “ponto de encontro do mundo”, onde o “Ocidente se encontra com o Oriente”. E serão criadas várias outras infra-estruturas para acolher convenções e exposições. “Em Macau o casino é cinco por cento da propriedade total. Não estamos centrados no casino”, garante.
O mentor do projecto, Sheldon Adelson, também está a ser “documentado”. “Estamos a tentar filmá-lo e à mulher, e temos imagens relativamente à sua visão, às suas decisões, mas também à sua personalidade. Temos tudo desde o primeiro dia em que foi a Veneza há anos atrás e continuamos a filmá-lo”, conta.
Luciana Leitão
Fotografia: António Falcão/ bloomland.cn

Grupo de Macau quer criar centro comunitário em Timor-Leste

Quatro raios de sol

Quatro pessoas, duas paixões. Timor-Leste encantou Fernando Madeira desde a primeira hora em que pisou o solo do país do sol nascente. À segunda visita, o jovem de Macau despediu-se com a certeza de que um dia ia lá voltar. Desta vez, com um propósito diferente.
Os acontecimentos seguintes obedeceram a uma ordem natural. Foi uma questão de tempo, encontros e coincidências. Fernando Madeira e Hugo Oliveira partilham, além da amizade, uma dedicação à agricultura biológica e orgânica. No Verão passado, Vera Piteira e Patrícia Pereira visitaram o território trazendo um projecto em fase embrionária de criação de um centro comunitário virado para a educação para o desenvolvimento sustentável. Somaram-se dois mais dois e nasceu a iniciativa “Raio de Sol”. Uma ideia que ganhou as primeiras folhas na RAEM, mas que o grupo ambiciona plantar na cidade timorense de Baucau.
Uma urbe que, embora seja a segunda maior do país, está longe das atenções das organizações não-governamentais instaladas em Timor-Leste. “Grande parte do foco de actividades está na capital, em Díli. Concluímos que Baucau seria uma boa aposta exactamente por esta razão”, apontou Hugo Oliveira.
Recentemente regressados da primeira viagem de “reconhecimento de terreno”, os quatro jovens estarão até Julho espalhados por Macau, Tailândia e Austrália. A primeira etapa do projecto está já concluída. O bispo da Diocese de Baucau, D. Basílio Nascimento, deu a sua bênção ao projecto e disponibilizou três terrenos à escolha dos dinamizadores do projecto “Raio de Sol”. Fernando, Hugo, Vera e Patrícia visitaram os locais e elegeram um espaço com 30 mil metros quadrados.
“Escolhemos aquele que estava mais perto da comunidade e que reunia as melhores condições. Já tem duas casas, uma precisa de ser restaurada. Já temos uma ideia do que se pode introduzir no terreno para melhorá-lo”, explica Fernando Madeira, também fotógrafo freelancer.
A iniciativa está planeada para seis meses de actividade e contempla duas vertentes complementares. A primeira é a exploração do terreno seguindo as orientações da PermaCultura.
O conceito surgiu há cerca de 30 anos, através dos ecologistas Bill Mollison e David Holmgren, e advém da produção agrícola permanente e da policultura. “Basicamente, a ideia por trás da PermaCultura é conseguir criar um ecossistema em que nós seres humanos consigamos produzir a nossa alimentação, mas num sentido auto-generador. Isto é, através da produção da nossa alimentação estamos também a produzir solo e não a consumi-lo”, explicou Hugo Oliveira.
Os quatro jovens do Raio de Sol pretendem então criar terraços para produzir solo. O objectivo é resolver o problema do terreno da cidade timorense ser demasiado rochoso, limitando o crescimento das raízes. A terra vai ser fertilizada por via de métodos naturais. Serão ainda montados vários sistemas de captação de água da chuva e criada uma pequena fonte de bio-gás para uso doméstico.
“A intenção é que seja tudo demonstrativo para que as pessoas que visitem o centro possam observar e levar a ideia consigo”, sublinhou Hugo Oliveira. “Tudo é montado para ser acessível à população. Poderíamos tentar instalar um painel solar, mas isso não faria sentido, porque os timorenses não conseguem suportar esses custos”, acrescentou por sua vez Fernando Madeira.
O Raio de Sol está pensado para funcionar em regime de voluntariado, atraindo a população para colaborar com as actividades diárias para assim lhes transmitir as técnicas de desenvolvimento sustentável e auto-suficiência. Algo que já existe em Timor, mas que necessita de ser protegido.
Nas palavras dos dois jovens, 95 por cento da produção agrícola timorense é ainda orgânica, sem a introdução de químicos. “O país tem tudo para ser um exemplo para o mundo de como é possível produzir sendo-se auto-sustentável”, defendeu Hugo Oliveira.
“É preciso mostrar que o que fazem tem muito valor. Quando ligam a televisão, vêem o mundo Ocidental com toda a tecnologia e pensam que aquele é o caminho a seguir. Pensam que os seus métodos são atrasadíssimos, que é passado e o futuro são as máquinas e as grandes produções. Queremos contrariar essa visão”, rematou Fernando Madeira.
Após a conclusão da primeira etapa de reconstrução e criação dos espaços demonstrativos, começa a dinamização do centro. Em simultâneo com os trabalhos da terra, as sementeiras e as plantações, o quarteto vai focar-se também na área educacional e nas artes. Com base no conceito de educação holística, serão organizadas pequenas formações dirigidas à população. Os residentes locais têm ainda liberdade de usar o centro para organizar os seus próprios workshops.
A ideia é, ao longo de seis meses de actividade, transmitir os conhecimentos aos habitantes timorenses para, no final, passar o testemunho às organizações locais e à Diocese. No entanto, para seja possível pôr as mãos à obra, falta ainda um elemento essencial: o financiamento.
Julho é a data em que o grupo está a apostar para o arranque do “Raio de Sol”. Contudo, o regresso a Baucau está dependente da obtenção de um fundo de cerca de 300 mil patacas. “Até agora ainda não temos nada. Enviamos cartas a várias entidades e organizações de Macau e estamos à espera de respostas”, lamentou Fernando Madeira.
Nada que abale a confiança e o entusiasmo do quarteto. Mesmo sem o montante necessário, os jovens partiram para Timor-Leste para semear as primeiras bases do projecto.
“Neste momento, o Raio de Sol tem uma cara nova, porque esta ida enriqueceu a iniciativa. As pessoas vão perceber que já houve um avanço, mesmo com a ausência do financiamento. Isso demonstra que estamos de alma e coração no projecto”, frisou Fernando Madeira.
Resta agora reformular a apresentação do Raio de Sol, traduzir também para a língua inglesa e “espalhá-lo mais”, completou Hugo Oliveira. “Se até Julho não surgirem novidades vamos ter que adiar tudo até haver fundos.”

O projecto cara a cara

São dois rapazes da cidade que desde tenra idade ganharam o gosto pelas lides do campo. Fernando Madeira e Hugo Oliveira nasceram em Lisboa, tomaram rumos de vida diferentes, mas estão unidos pela mesma paixão: a PermaCultura. Vera Piteira e Patrícia Pereira correm juntas a Ásia com uma companhia centrada na educação de crianças. O quarteto dá corpo ao “Raio de Sol”, um projecto em Timor-Leste, cujo quartel-general é Macau.
Fernando Madeira, fotógrafo e residente na RAEM, tem 28 anos e desde pequeno que gosta de mexer na terra e dedicar-se a técnicas alternativas de agricultura. “Posteriormente, comecei a fazer disso um modo de vida ou pelo menos parte dela. Então procurei cursos nas áreas da agricultura biológica e orgânica”, contou.
É aqui que surge a PermaCultura. “Não é só agricultura, este conceito engloba tudo desde a construção da habitação, a captação da água das chuvas, a manutenção da horta e a integração dos animais nesse sistema todo”, explicou.
Pelo caminho, o também antigo desportista da Casa de Portugal em Macau descobriu ainda a agricultura biodinâmica. “Há alturas certas para plantar todos os produtos, consoante as posições da lua e dos planetas. A planta nasce muito mais revitalizada e forte, aguentando por exemplo as pestes e evitando o recurso aos pesticidas”, defendeu.
Em Julho do ano passado, Fernando Madeira frequentou o primeiro curso de PermaCultura durante três semanas na Tailândia. No futuro, o jovem quer fazer outra formação antes de partir para Timor-Leste.
Hugo Oliveira é licenciado em Biologia Marinha. “Dentro de mim, queria que de alguma forma o ser humano vivesse em harmonia com a natureza”, explicou a opção académica.
Terminada a licenciatura na Universidade dos Açores, o jovem português de 27 anos, sentiu-se insatisfeito com os conhecimentos até ali adquiridos. “Comecei à procura de um movimento que fosse realmente efectivo. Entre várias procuras, fui encontrar as eco-aldeias e a PermaCultura”, recordou.
Em Londres, fez a primeira formação em PermaCultura, corria o ano de 2006. De regresso a Portugal, frequentou cursos de “Eco-village Design Education”. Os mesmos worshops levaram-no à Índia e à Tailândia.
Reunidos os conhecimentos e dominadas as técnicas do conceito agrícola em meios tropicais, o jovem quis conhecer a realidade oposta. Viajou para o norte da Índia, onde aprendeu a trabalhar terrenos em zonas de climas frios.
A próxima paragem é a Austrália. Hugo Oliveira vai permanecer quatro meses na terra dos cangurus a tirar mais um curso sobre eco-aldeias.
Actualmente no norte da Tailândia a desenvolver treino de contador de histórias, o duo feminino do projecto Raio de Sol possui uma companhia denominada Brainstorming que organiza actividades educacionais para crianças. Vera Piteira estudou Psicologia Educacional em Lisboa. Já Patrícia Pereira deixou incompleto o curso de Biologia Marinha na Universidade dos Açores e tornou-se animadora sócio-educativa no Instituto de Apoio à Criança no arquipélago português.

Workshop de PermaCultura em Macau adiado

“Na minha casa, tenho um terraço onde aplico as técnicas da PermaCultura em pequena escala. Faço captação da água da chuva, tenho uma pequena horta orgânica, pequenas árvores de fruto e animais que produzem composto, etc.” O exemplo de Fernando Madeira é uma prova de que em meios urbanos como Macau é possível criar ecossistemas nas nossas próprias casas.
Condições é algo que não falta à cidade, defendeu. Por estas razões, a RAEM é uma paragem obrigatória na rota dos projectos do fotógrafo e de Hugo Oliveira. Uma iniciativa que esteve recentemente para ver a luz do dia, mas foi adiada por motivos de ordem pessoal.
“Gostaríamos de organizar um workshop de PermaCultura urbana em Macau. Tentar dar exemplos do que se pode fazer na cidade. Aqui há muitos terraços e essa é umas das condições para aplicar estas técnicas”, frisou Fernando Madeira.
A par das acções de formação para adultos, a dupla pretende também chegar aos mais pequenos. “Há ainda o aspecto educativo, indo às escolinhas mostrar o que é a PermaCultura. Instalar algumas hortas orgânicas nos estabelecimentos de ensino”, exemplificou.
Este método agrícola rege-se por um planeamento, actualização e manutenção de sistemas de escala humana (jardins, vilas, aldeias e comunidades) ambientalmente sustentáveis, socialmente justos e financeiramente viáveis. A auto-sustentabilidade é um objectivo que não é concretizável em Macau. No entanto, existem outras vantagens da aplicação destas técnicas no território, apontou Fernando Madeira.
“Obviamente que não podemos falar de auto-suficiência no território, mas é possível criar uma harmonia entre o homem e a natureza. É saudável manter-se uma certa ligação com o mundo natural no dia-a-dia e abstrair-se da confusão. Isso é bom para o bem-estar psicológico de qualquer pessoa.”
Alexandra Lages
Fotografia gentilmente cedida por Fernando Madeira

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