terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

Ao Man Long não vai interpor recurso, Aumentos na Função Pública discutidos hoje na AL

Defensor de Ao Man Long não vai interpor recurso da decisão do TUI

“O resultado seria o mesmo”

A defesa do ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas, Ao Man Long, não vai interpor recurso do acórdão do Tribunal de Última Instância (TUI) que, na quarta-feira passada, condenou o antigo governante a 27 anos de prisão pela prática de quatro dezenas de crimes de corrupção passiva, além de crimes de branqueamento de capitais.
“A questão que se coloca é que o Tribunal entende não ser admissível o recurso, pelo que a sentença transita em julgado”, considerou Nuno Simões, o advogado de Ao Man Long, em declarações ao Tai Chung Pou. Assim sendo, continuou o defensor, “interpondo ou não recurso, o resultado seria o mesmo”.
Recorde-se que, num despacho de admissibilidade de um recurso interposto pela defesa em Dezembro último - em que esta apelava à nulidade do meio de obtenção de prova -, Viriato Lima, um dos juízes do colectivo do TUI, sustentou não haver possibilidade de recurso no caso presente, fazendo uma interpretação da Lei de Bases de Organização Judiciária que mereceu reparos por vários advogados de Macau.
A lei dita que, tratando-se de um titular de um alto cargo político, Ao Man Long teria que ser julgado pelo TUI, mesmo tratando-se da avaliação do caso em primeira instância. A mesma legislação prevê que o TUI possa ter uma formação alargada a cinco juízes – mais dois do que o colectivo que julgou o ex-secretário – mas não dota esta composição de competências para avaliar recurso de caso que o Tribunal conhece em primeira instância.
Esta aparente lacuna na lei – que resultou, na realidade, de uma decisão de índole política tomada em 1999, antes da entrada em vigor da legislação – levou já vários juristas e deputados a defenderem a revisão do diploma que define o funcionamento dos tribunais da RAEM.
No despacho emitido por Viriato Lima, e embora dissesse respeito a uma questão levantada durante o julgamento, o TUI avisou logo que, se a defesa pretendesse recorrer da decisão final, a resposta seria a mesma, ou seja, não haveria margem para a interposição de recurso do acórdão do tribunal.
É neste contexto que surge a decisão de Ao Man Long. Depois de uma reunião realizada ontem de manhã, e dado este contexto, a defesa optou por mais nada fazer em relação ao caso, embora Nuno Simões não concorde, pessoalmente, com a posição assumida.
O ex-governante, de 51 anos de idade, foi considerado culpado de 57 dos 76 crimes que lhe tinham sido imputados. A pena em cúmulo jurídico de 27 anos é a mais gravosa de que há memória em Macau. Nas reacções à leitura do acórdão do TUI, foram muitas as figuras públicas que salientaram a “justiça” com que se processou o julgamento, tendo igualmente lamentado a inexistência da possibilidade de recurso.
Na fundamentação da decisão, o presidente do colectivo de juízes, Sam Hou Fai, considerou que os crimes praticados danificaram a imagem da RAEM no exterior e tiveram repercussões negativas para a acção governativa de Macau, tendo ainda sublinhado que, durante todo o processo, o arguido não mostrou arrependimento pelos seus actos.
Este carácter “político” da decisão do Tribunal de Última Instância foi sublinhado por deputados à Assembleia Legislativa e por outras figuras públicas de Macau, numa lógica de dissuasão a este tipo de criminalidade, mas outros observadores – essencialmente do meio jurídico – consideraram demasiado pesada a pena que o ex-secretário terá que cumprir, uma vez que se trata de um crime de colarinho branco e não de sangue.
Ao Man Long, detido a 6 de Dezembro de 2006 e desde então detido preventivamente, vai comparecer no Tribunal Judicial de Base (TJB) no próximo dia 26, na condição de testemunha do processo conexo que está a decorrer no TJB. O colectivo presidido por Alice Costa está a julgar a mulher, irmão, cunhada e pai do antigo governante – acusados de crimes de branqueamento de capitais –, e os empresários Frederico Nolasco da Silva, Ho Meng Fai e Chan Tong Sang, que respondem por corrupção activa e branqueamento de capitais.

Caso Ao Man Long fica por aqui

O advogado do ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas, Ao Man Long, não pondera apresentar o caso da impossibilidade de recurso junto de instâncias internacionais. Confrontado com a possibilidade de dar a conhecer o processo a entidades internacionais, Nuno Simões disse ao Tai Chung Pou que tal cenário “não está nos nossos horizontes”. Uma vez que a defesa não vai recorrer – até porque o TUI já avisou da inadmissibilidade de recurso no caso presente – Ao Man Long vai ter mesmo que cumprir os 27 anos de prisão a que foi condenado.
A verdade é que, de acordo com juristas ouvidos pelo Tai Chung Pou, seria muito difícil, se não mesmo impossível, o advogado conseguir que o caso fosse analisado por organismos internacionais.
O Pacto Internacional sobre os Direitos e Civis e Políticos, vigente na RAEM, prevê a possibilidade da apresentação de queixas de indivíduos contra o Estado, mas essa hipótese foi criada através de um protocolo adicional ao Pacto que não está em vigor em Macau.
A República Popular da China notificou, em 2 de Dezembro de 1999, o Secretário Geral da Organização das Nações Unidas, na sua qualidade de depositário do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, sobre a continuação da aplicação na Região Administrativa Especial de Macau do referido Pacto. Não é conhecido, contudo, semelhante procedimento em relação ao protocolo adicional que Portugal ratificou em 1991, mas que não se inclui no conjunto de disposições que transitaram aquando da transferência de administração do território.
Mesmo que o protocolo adicional do Pacto estivesse em vigor em Macau, da sua aplicação não resultaria qualquer efeito prático no desfecho do processo. No máximo, poder-se-ia suscitar um problema de responsabilidade internacional.
Isabel Castro
Fotografia: António Falcão/ bloomland.cn

Aumento de 7,2 por cento para a Função Pública discutido hoje na AL

Diploma “deverá passar”

É hoje apresentada e discutida na generalidade, na Assembleia Legislativa, a proposta de lei que visa aumentar os vencimentos dos trabalhadores da Administração Pública, na percentagem de 7,2. Um diploma que “deverá passar”, conforme afirmaram ao Tai Chung Pou os deputados Ng Kuok Cheong e Pereira Coutinho. Contudo, se para o também vice-presidente da Associação Novo Macau Democrático o aumento é “aceitável", para Pereira Coutinho está longe de o ser, por “não acompanhar a inflação”.
A proposta de lei sobre a actualização dos vencimentos e pensões da Administração Pública surge na sequência do aumento de 7,2 por cento anunciado na apresentação das Linhas de Acção Governativa. Um aumento há muito esperado, mas que não satisfaz todos. É o caso do deputado Pereira Coutinho que, apesar de manifestar que irá votar a favor, não deixou de salientar que “o aumento continua abaixo da margem de inflação, não conseguindo recuperar o poder de compra da maioria dos trabalhadores, principalmente os trabalhadores das classes mais humildes”.
Justificando a sua insatisfação face ao diploma que será analisado hoje em plenário, o também presidente da Associação dos Trabalhadores da Função Pública afirmou que não satisfaz “face à valorização do yuan”. Por isso, na sua opinião, o Governo deveria “introduzir medidas para aumentar o moral dos trabalhadores que está cada vez mais baixo”. Assim, apenas considera legítimo um “aumento indexado à inflação”. Pereira Coutinho não quis avançar com números por “ainda não ter sido actualizada” a taxa de inflação por parte da Direcção dos Serviços de Estatísticas e Censos, tendo apenas afirmado que o aumento indexado à inflação deve ter em conta o “que for estipulado na legislação”.
Já Ng Kuok Cheong considera o aumento “razoável”, resultante de um “ajustamento normal”. Como tal, “deverá ser aprovado tranquilamente”, não devendo existir grande oposição. Por isso, é um aumento “aceitável”. Quanto ao acompanhamento dos salários da Função Pública em relação à inflação, o deputado afirmou que “não foi mais baixo nem mais alto”. Foi o mais “aceitável”, reiterou.
Segundo o documento justificativo da proposta de lei, a referida percentagem “corresponde ao factor de actualização” que foi tornado público na apresentação das LAG. Trata-se de uma proposta de lei que, se for aprovada, revoga a Lei nº1/2007, alterando o valor do índice 100 da tabela constante do mapa um do anexo um do Decreto-Lei 86/89/M de 5500 para 5900 patacas.
A medida foi anunciada em Novembro pelo Chefe do Executivo na apresentação das Linhas de Acção Governativa para 2008. Na altura, afirmou tratar-se de uma actualização do factor multiplicador do índice remuneratório dos funcionários públicos de 55 patacas para 59 - um valor acima da taxa de inflação que, em 2007, se situava nos seis por cento. Apesar de só chegar hoje ao hemiciclo, o diploma terá efeitos retroactivos a 1 de Janeiro deste ano.
Luciana Leitão

História de uma empresa familiar com seis décadas de existência

Símbolos do quotidiano

Nasceu numa altura em que o plástico era uma inovação tecnológica e, à semelhança de outros negócios bem-sucedidos de Hong Kong, consegue resistir às mudanças que os tempos trazem sem perder o seu carácter familiar. A Star Industrial e a sua marca “A” são, provavelmente, os produtos de plástico com maior tradição na antiga colónia britânica, no que aos objectos de casa diz respeito.
Tal como outras empresas de sucesso em Hong Kong, a Star Industrial é uma empresa gerida por uma família, com origem na China pré-comunista. No entanto, e ao contrário de outras indústrias estabelecidas no território antes de 1949, a empresa não mudou uma única linha de produção para a China Continental, numa altura em que pouco se produz localmente.
“Uma fábrica deve ser gerida pelo seu proprietário”, explica Daisy Leung, directora-geral e gestora da área financeira da Star Industrial. “Se coloco os moldes numa fábrica no interior da China, eles (trabalhadores) podem fazer o que quiserem. Sei de casos em que os trabalhadores usaram os moldes das empresas para fazerem produtos e vendê-los como se fossem seus. O patrão não estava lá”, atira, sem papas na língua.
A Star Industrial tem um edifício próprio em Kowloon, onde se encontram todos os funcionários. A garantia de segurança em relação às patentes não é a única razão – só assim é possível manter o controlo de qualidade, diz a responsável.
A comemorar o 60º aniversário este ano, a Star Industrial está presente na vida das pessoas, através de pequenos objectos, há várias gerações. Antes de rumarem para Hong Kong e para as regras do mercado capitalista, a família Leung produzia e vendia escovas de dentes na próspera Xangai. Em 1948, quando se mudou para a então colónia britânica, a empresa lançou as escovas de dentes “ACE” e, dois anos mais tarde, começou a fazer recipientes de plástico.
Questões relacionadas com propriedade intelectual fizeram com que a marca “ACE” tivesse que ser substituída por apenas um “A” dentro de um círculo vermelho, que passou a ser rapidamente identificado e associado a símbolo de qualidade. Durante os anos 1960, os recipientes de plástico começaram a ser cada vez mais procurados, com as frequentes falhas no abastecimento de água que obrigavam a improvisar soluções de recolha e de armazenamento.
A década seguinte e o impacto do plástico no quotidiano permitiu alargar o leque de produtos a oferecer aos consumidores, nomeadamente através de peças de mobiliário. Nos anos 1980, assistia-se à deslocalização da produção para a China, mas a empresa familiar decidiu ficar no Delta do Rio das Pérolas que, então, estava longe de conhecer o desenvolvimento a que hoje se assiste.
Na década de 1990, a Star Industrial fez um esforço para se adaptar às exigências do mercado e começou a produzir recipientes para fármacos, bem como embalagens para alimentos e bebidas. Estas duas áreas de produção revelaram ser uma aposta ganha, a representarem actualmente, cada uma, 30 por cento das vendas. Os restantes 40 por cento são conseguidos maioritariamente com a comercialização de produtos para casa.
Com os tempos foram também sendo diversificadas as ofertas em termos de design e da paleta de cores que, no princípio, tinha no vermelho e no azul os tons principais. A resposta à necessidade de evolução e a arte do plástico são, no entanto, bem mais complicadas do que a simples escolha de cores.
“Na realidade, gosto muito de trabalhar em projectos difíceis. Não existe avanço se não enfrentarmos desafios”, sublinha Daisy Leung. A mais recente vitória da empresa está relacionada com a indústria da aviação: trata-se da produção dos recipientes onde são colocadas as malas. “Antes de chegarem ao tapete rolante onde são recolhidas pelos passageiros, as malas passam por uma rede enorme de tapetes rolantes, nos quais têm que ser colocadas estruturas de plástico que aguentem com o peso. Estes moldes não são fáceis de conseguir”, explica. Quanto maior for o recipiente, mais difícil é a sua produção, sendo que a encomenda do Aeroporto Internacional de Hong Kong exigiu várias fases de testes até se chegar à fórmula ideal.
Daisy Leung não quer, de modo algum, que a empresa pela qual é responsável seja ultrapassada e anda sempre à procura de novas ideias para desenvolver. Quanto ao reconhecimento da Star Industrial, há vários exemplos de como a fábrica conseguiu, ao longo das suas décadas de existência, criar tendências em Hong Kong.
No ano passado, a Aluminum, uma empresa local de design de mobiliário, criou um banco de plástico que pretende ser uma evolução dos padrões dos anos 1960 da Star Industrial. A empresa deixou de produzir a linha de mobiliário há já muito tempo, mas estes produtos continuam a estar na lista dos mais procurados da eBay.
Daisy Leung não admite, contudo, voltar aos tempos antigos e recuperar a linha de mobiliário, embora se orgulhe do seu significado. “Seria fácil, sem dúvida mas, se voltamos às linhas de produção antigas, tal significa que não somos capazes de ter novas ideias.” De vez em quando, recebem pedidos de clientes à procura de objectos da década de 1970, mas a empresa não aceita voltar a produzir as peças, não obstante o facto de os moldes continuarem guardados na fábrica. “Na altura não havia testes de qualidade e os actuais padrões de segurança são muito elevados. Não podemos correr o risco de vender produtos só porque existe um revivalismo em torno deles”, justifica Daisy Leung.
A responsável diz que a sua preocupação principal continua a ser a promessa feita há sessenta anos: a Star Industrial e a “A” são símbolos de segurança e de qualidade. Este tipo de indústria exige preocupações especiais com todas as fases de produção, do plástico propriamente dito aos materiais utilizados para dar cor, passando pelos acabamentos.
Os padrões de controlo e o compromisso com a qualidade têm um custo inevitável – os produtos “A” são mais caros do que os da concorrência. “Se tivesse investido os lucros da fábrica em imobiliário, talvez tivesse enriquecido”, brinca Leung. Admitindo que os lucros são menores pelo facto de ter a fábrica instalada em Hong Kong, insiste que tal é preferível a perder qualidade. “Comparativamente com a produção do interior da China, temos uma forma de pensar diferente, que passa, sobretudo, pela qualidade. A nossa empresa sempre foi gerida tendo em conta o conceito de responsabilidade social.”
Sublinhando a importância de o negócio pertencer à sua família, Daisy Leung alerta, contudo, para a necessidade de se querer mais do que aquilo que já foi conquistado. “Gostamos de desafios em todos os aspectos. Não fui feita para chegar aqui e assinar documentos”, remata.

Kahon Chan, em Hong Kong,
com Isabel Castro

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