quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Inquilinos à mercê dos senhorios, Os caracteres que abrem as portas do mundo

Lei do arrendamento não é cumprida nem fiscalizada

Inquilinos à mercê dos senhorios

Calçar os ténis. Percorrer a cidade. Bater de porta em porta em busca do agente imobiliário que vai ajudar a encontrar a casa, a renda e o contrato perfeitos. De início, reina o entusiasmo e o optimismo. Mas basta uma semana para perceber que é difícil ou mesmo impossível conseguir os três ao mesmo tempo. Resta saber de que ferramentas dispõem os residentes de Macau para combaterem os desvirtuamentos do mercado imobiliário.
O diploma que regula o arrendamento no território é o Código Civil de Macau. Para o advogado Óscar Madureira, a actual legislação coloca o arrendatário numa posição desfavorável. “Pela forma como o senhorio denuncia o contrato, que se revela pouco protector do arrendatário”, explica. A isto juntam-se outros factores. “Os prazos de duração do contrato são pequenos, a própria forma de aumento das rendas não está bem definida na lei, as portarias nem sempre são publicadas, havendo aqui um vazio legislativo”, acrescenta. Aliás, “o senhorio pode aumentar em 100 por cento a renda, terminado o contrato”. Uma situação que, com a bênção da lei – ou da ausência dela -, coloca o arrendatário à mercê do senhorio.
Infere-se do artigo 1038º, nº 2 que o contrato de arrendamento nunca pode ser celebrado por um período inferior a dois anos ou, conforme explicou Óscar Madureira, três, segundo o acórdão emitido pelo Tribunal de Segunda Instância em 2005 (ver texto nesta página). Mas a realidade é bem diferente. Montantes abusivos de rendas, contratos por um ano ou contratos por um valor no primeiro ano e por uma renda superior no ano seguinte. E os montantes fixados em dólares de Hong Kong, ao invés de patacas, violando o artigo 1033º, nº1. O arrendatário sujeita-se à vontade do senhorio.
“O inquilino tem pouca capacidade financeira, a maioria das casas não justificam um grande montante pecuniário, mas a situação no território alterou-se de forma a que as rendas subiram de forma invasiva, sem existir protecção na lei”, diz Óscar Madureira. Quem sofre é o cidadão que acaba por se sujeitar a este tipo de condições. “Muitas vezes, antes mesmo destes dois anos de contrato, o senhorio, por sua iniciativa, resolve denunciar o contrato ou então exigir um aumento de renda superior”, declara. Se o inquilino se queixa ou se recusa a cumprir as exigências, o senhorio alega que, nesse caso, “quer vender a casa”. E até pode fazê-lo, mas não pode expulsar o inquilino sob estes pretextos. “O senhorio pode vender a casa com o arrendatário lá – aliás, o arrendatário até tem direito de preferência na aquisição da casa”, explica. Na realidade, existe uma norma no Código Civil que permite o despejo definitivo – “no caso de o senhorio ter necessidade de recorrer ao imóvel para a sua própria habitação”. Nesta última hipótese, então o contrato pode ser terminado antes do termo, mas “o arrendatário tem direito a indemnização”.
Na prática, o que acontece é que “o arrendatário, sendo uma parte frágil, cede à pressão”. Uma pressão que leva a que o inquilino aceite um contrato por um período inferior ao mínimo previsto por lei, ou que abandone a habitação findo o tempo que o senhorio quiser, ou que aceite um aumento de renda desproporcional. Por seu turno, aquilo que Óscar Madureira encara como “um ceder à pressão”, o advogado Américo Fernandes considera equivaler, muitas vezes, a um “respeito à palavra dada” aquando da assinatura do contrato. “As pessoas muitas vezes optam por cumprir o prometido”, diz. E não considera que a legislação actual favoreça qualquer uma das partes, havendo, ao invés, “um equilíbrio”. “Antigamente, o sistema era vinculístico – enquanto o arrendatário pagasse a renda, o senhorio não o poderia expulsar; hoje em dia, o senhorio, avisando com antecedência, e cumprindo o prazo, já consegue expulsar o arrendatário”, explica.
Face a este panorama, em última instância, o que pode fazer o arrendatário? Pode apresentar uma queixa ao Instituto de Habitação, a entidade que tutela, ou recorrer à via judicial “para que o tribunal reconheça o direito do arrendatário”, afirma Óscar Madureira. Mas a “justiça não é célere e é cara”, constituindo, regra geral, a última alternativa possível.
Uma situação insustentável que conta com a “permissividade do Governo da RAEM”. Na opinião do causídico, o Executivo “não tem contribuído para que a realidade do mercado imobiliário de Macau seja mais justa”. Devia ter um papel mais forte “alterando” a legislação, mas também “fiscalizando”.
Numa perspectiva que Óscar Madureira assume como “utópica”, o advogado sugere a criação de um gabinete de fiscalização dos imóveis que serão arrendados. Além disso, propõe que seja criada uma tabela e um índice de rendas a cobrar por metro quadrado por áreas de localização. Rendas que teriam também em conta a “área interna dos apartamentos, o próprio andar, as condições de salubridade do edifício”. Medidas que considera “polémicas”, mas que não deixa de considerar necessárias. E sugere um exercício que o próprio costuma praticar: passear por Macau e “ver que há casas vazias, prédios novos com luzes apagadas, rendas e preços de venda que são altíssimos, mesmo para a classe média”.
Ainda ontem o director-geral da Associação do Sector Imobiliário, Ip Kin-wa, referindo-se aos estranhos fenómenos relativos ao mercado imobiliário, disse que um dos factores que tem estado por detrás do aumento das rendas e dos preços da propriedade é o crescimento do número de trabalhadores estrangeiros que têm vindo para Macau. Por exemplo, desde a abertura do hotel-resort Venetian, as rendas na zona do ZAPE aumentaram entre 30 e 50 por cento, comparando com o período homólogo do ano passado. “Um T2 custava 5000 MOP por mês, agora é 7500”, disse. Algo que também tem vindo a atrair mais investidores no mercado imobiliário.
Contratos no mínimo por três anos

O acórdão não é novo. Emitido a 16 de Junho de 2005, a decisão do Tribunal de Segunda Instância (TSI) vem, na opinião de alguns juristas, fixar em três anos o prazo mínimo de duração do contrato de arrendamento. O tribunal “julgou procedentes os fundamentos da autora [a senhoria] que entende que o contrato de arrendamento foi celebrado por dois anos com início a 1 de Janeiro de 2000 e termo a 31 de Dezembro de 2001, cabendo-lhe a faculdade de não o renovar se entretanto comunicasse essa sua intenção de não renovação do contrato com três meses de antecedência, como sucedeu com a sua carta de 22 de Agosto”. Em suma, ao dar razão à autora da acção, o tribunal, de acordo com vários juristas contactados, vem fixar em três anos o prazo mínimo de um contrato de arrendamento. Isto porque, se a empresa não tivesse comunicado a intenção de denúncia, o “contrato ter-se-ia renovado automaticamente por mais um ano”, afirma Óscar Madureira, que se fundamenta no artigo 1039º, nº3.
Neste caso, a acção de despejo foi intentada pela Empresa de Fomento Predial e Comercial Limitada que visava despejar imediatamente um casal da fracção arrendada para fins comerciais. Uma situação que se aplica, na opinião dos juristas contactados, ao arrendamento para fins habitacionais, já que a lei não faz a distinção em termos de regime aplicável. O acórdão foi aprovado por unanimidade, fazendo parte do colectivo Choi Mou Pan, José Maria Dias Azedo e Lai Kin Hong.

Regular os agentes imobiliários

Quanto à proposta de Regime Jurídico da Actividade de Mediação Imobiliária submetido a consulta pública até dia 13 de Março, Óscar Madureira não tece grandes comentários por ainda “não conhecer o diploma”. Mas afirma que é muito “importante e necessário que se reveja o papel das agências imobiliárias”. Até porque, na sua opinião, um dos problemas passa por as “empresas arranjarem habitações caras para as pessoas, fazerem-nas assinar contratos ilegais e depois da assinatura abandonarem-nas por completo”. O resultado? “Não têm nenhuma responsabilidade no que acontece depois da assinatura do contrato”, responde.
Recorde-se que o projecto visa regular a actividade das agências imobiliárias, de forma a promover o desenvolvimento saudável do mercado imobiliário. Em traços gerais, o diploma vem exigir a licença para exercer a profissão, que apenas será emitida caso os agentes tenham o ensino secundário elementar e tenham superado um exame de habilitação, realizado trimestralmente, sobre os conhecimentos necessários ao exercício da função. Terão ainda de trabalhar expressamente para uma mediadora imobiliária e comprovar a sua idoneidade. A proposta de lei propõe-se ainda a fiscalizar e a aplicar sanções, que passam pelo cancelamento da licença, multa, interdição do exercício da profissão. Outra das novidades inclui também a obrigatoriedade de um contrato entre o cliente e o agente imobiliário.
Luciana Leitão

Temperaturas só vão subir na próxima semana

Longo Inverno em Macau

Os cachecóis e os casacos mais grossos vão continuar a ser necessários pelo menos até à próxima segunda-feira. As temperaturas em Macau não deverão subir nos próximos dias, de acordo com as previsões dos Serviços de Meteorologia e Geofísica da RAEM. Para hoje, a mínima deverá ser 7 °C e a máxima cerca de 12 °C.
As baixas temperaturas que se têm registado no território fazem com que este tenha sido já considerado o mais rigoroso Inverno dos últimos 30 anos. “Das últimas três décadas, este é o ano que mais dias regista com temperaturas mínimas inferiores a 10 graus”, explicou ao Tai Chung Pou o director dos Serviços de Meteorologia, Fong Soi Kun.
Segundo o mesmo responsável, o frio vai continuar por mais alguns dias. “As nossas previsões apontam para que os termómetros só comecem a subir a partir da próxima segunda-feira”, disse. O rigor deste Inverno de Macau deve-se ao facto de “o anticiclone continental que vem da China e traz uma massa de ar frio não ter descido para sul”.
Normalmente, precisa o meteorologista, esta massa de ar frio atinge a costa e segue para o mar do Sul da China. Desta vez, “ficou por aqui”. “Com o vento que vem do Sul, que é húmido, cria-se uma camada de nuvens em cima deste ar frio”, continua Fong Soi Kun. O rigor deste Inverno é consequência das alterações climáticas que têm acontecido a nível global, referiu ainda Fong Soi Kun.
Estas temperaturas a que Macau não está habituado, pelo menos durante um período tão longo, têm causado muitas constipações, não obstante o facto de os Serviços de Saúde terem já vacinado 30 mil residentes pertencentes aos grupos que mais facilmente contraem gripe.
Em Hong Kong, há muito que não se vivia um período tão prolongado de temperaturas abaixo dos 12 graus Célsius. Em 1968, o Inverno ainda foi pior, mas é provável que 2008 entre para a história, porque o recorde de há 30 anos deverá ser batido, com as previsões a apontarem para mais sete dias de frio.
A situação é incomparável com aquela que se vive na China, com o mau tempo a afectar, desde o mês passado, milhões de pessoas. O cenário tem vindo a melhorar nos últimos dias, mas a Administração de Meteorologia não descarta a possibilidade de as temperaturas voltarem a descer, no espaço dos próximos dez dias, provocando mais neve, geada e chuva.
A Organização Meteorológica Mundial das Nações Unidas considera que o fenómeno La Nina pode ser uma justificação parcial para o que está a acontecer no país, principalmente na zona Sul, onde os termómetros não costumam descer tanto. Existem ainda outros factores a contribuir para a queda de neve, mas o La Nina será um deles. Oposto ao El Nino, este fenómeno consiste numa invulgar quantidade de água fria no Pacífico, que se desenvolve regularmente e influencia globalmente o estado do tempo.

Estado de saúde de Ramos Horta é “sério mas estável”, Díli sem incidentes

O medo do costume

A noite já tinha caído em Díli sem que nenhum distúrbio tivesse marcado o dia seguinte ao do atentado que feriu com gravidade o presidente de Timor-Leste, José Ramos Horta. “Está tudo tranquilo”, descreveu ao Tai Chung Pou o fotojornalista Cláudio Vaz, que se encontra na capital maubere.
À excepção do reforço das tropas australianas em Díli – mais 200 soldados na capital e uma fragata com 150 homens -, e dos muitos militares que se vêem nas ruas, o quotidiano foi retomado com relativa normalidade. “A noite foi calma e cidade continua tranquila, embora se sinta que os timorenses têm medo.”
A pior hipótese – uma retaliação dos homens de Alfredo Reinado, morto na passada segunda-feira – parece, contudo, estar afastada. “Segundo dizem aqui, normalmente, quando há conflitos, a represália acontece logo na noite seguinte. Não aconteceu nada”, explica o fotojornalista brasileiro.
A manhã começou com a notícia de que José Ramos Horta deverá conseguir recuperar plenamente, se bem que os seus ferimentos sejam "terríveis" e que os danos no pulmão direito inspirem ainda alguns cuidados adicionais, segundo o responsável do Royal Darwin Hospital, em declarações à Agência Lusa. Len Notaras colocou ainda a possibilidade de o Chefe de Estado vir a ser sujeito a uma terceira intervenção cirúrgica durante a tarde de hoje. "O presidente continua numa condição muito séria mas estável", disse, citado pela Lusa.
A agência portuguesa avançou também ontem com a notícia de que as Falintil – as Forças de Defesa de Timor-Leste criaram uma comissão de inquérito ao ataque contra o presidente timorense, sendo que deverá apresentar as conclusões no prazo de duas semanas.
No rescaldo ao atentado ao Presidente da República, a população vive agora dias de incerteza. Os diálogos que manteve durante o dia de ontem permitem a Cláudio Vaz afirmar que se “sente que as pessoas estão muito preocupadas, porque já passaram por situações semelhantes inúmeras vezes”. Existe ainda o factor desconhecimento: “Em Timor-Leste, um fala com o outro e é assim que as notícias correm, os locais têm mais dificuldade de acesso à informação do que os estrangeiros que cá estão.”
Uma das notícias que foi ontem veiculada dava conta de disparos ouvidos no Bairro do Farol, à hora de almoço, que teriam causado feridos. As autoridades acabaram por desmentir a existência de um tiroteio. “Estive lá, não vi nada, ninguém viu”, confirmou Cláudio Vaz.
Tendo em conta as medidas de segurança nas ruas de Díli, depois dos dois ataques separados por homens armados que tentaram assassinar José Ramos Horta e o primeiro-ministro, Xanana Gusmão, e embora seja impossível fazer previsões para os próximos dias, o fotojornalista disse que existe a convicção de que os homens de Alfredo Reinado não vão protagonizar qualquer ofensiva.
Entretanto, mantém-se o estado de sítio até às 22 horas de hoje. Num comunicado a que o Tai Chung Pou teve acesso, o Presidente da República interino, Vicente da Silva Guterres, apelou “à serenidade e à unidade nacional”, pedindo à população, “especialmente aos jovens, que mantenham a tranquilidade e colaborem com as autoridades, para juntos superarmos mais um obstáculo na história da nossa jovem democracia”.
Cláudio Vaz diz que o estado de espírito dos timorenses, na generalidade, é o de pessoas que estão “à espera de que algo aconteça, que o Governo faça alguma coisa”. Dependentes, em muito, do apoio internacional, com muitas pessoas em campos de refugiados, vive-se uma situação “bastante complexa”. A frequência com que se registam distúrbios não ajuda à esperança. “As pessoas acostumaram-se a ter medo.”
Isabel Castro

Universidade do Minho aposta no ensino de Línguas e Culturas Orientais

Os caracteres que abrem as portas do mundo

Descobriu o curso “um pouco por acaso”, embora a China e a sua cultura sempre a tenham atraído, principalmente os misteriosos caracteres com que se comunica por escrito. Inês Reis tem 19 anos e é em Braga que está a aprender a escrever e a falar chinês, além de japonês. Uma tarefa a roçar o estoicismo quando o idioma que se fala nas ruas é o português, com sotaque do Minho.
Aluna do 1º ano do curso de Línguas e Culturas Orientais da Universidade do Minho (UM), Inês Reis faz parte de um conjunto de sessenta alunos, divididos por quatro graus, que se dedicam ao estudo dos caracteres mas também da cultura a Oriente. A maioria dos alunos são “jovens curiosos sobre China e o Japão”, explica Sun Lam, a directora do curso. Nas motivações de Inês Reis, à curiosidade juntou-se uma questão bem pragmática: as saídas profissionais.
“Estava em Relações Internacionais, no ano passado, e à medida que o primeiro semestre ia rolando fui-me questionando sobre o que faria com esse curso”, diz a jovem aluna. “A resposta era, provavelmente, nada!” A tempo de corrigir a escolha académica, Inês Reis começou a recolher informações sobre outras alternativas. “Línguas e Culturas Orientais pareceu-me ser, de longe, a melhor opção, porque só existia há três anos e ainda não havia licenciados e, sendo o único curso em Portugal nestes moldes, quem o conseguir acabar tem emprego”, contextualiza.
Não é uma área de formação que permita usufruir os anos académicos sem preocupações. “É completamente diferente de todos os cursos, pelo menos os da Universidade do Minho, quanto mais não seja por a maior parte dos professores serem orientais e terem uma exigência e métodos de trabalho distintos do ‘deixa andar’ português”, diz. “É muito exigente”, sublinha, “é impossível fazer o curso sem dar muito do nosso tempo e ir às aulas”. No final do primeiro semestre, e em jeito de balanço do último meio ano, Inês Reis conta que tem abdicado da maior parte dos fins de semana porque “a carga de trabalho é imensa”. Há muitos caracteres para aprender, além das restantes disciplinas teóricas.
Sun Lam confirma o grau de dificuldade do curso. “O estudo destas duas línguas é um desafio enorme, muito exigente em termos de trabalho e disciplina”. Nem todos os alunos têm a noção do grau de envolvimento que se exige, resultando em “algum insucesso escolar”. No entanto, atesta a directora de curso, “aqueles que ficam até ao fim são alunos dedicados e sentem que os seus conhecimentos abrem vastos horizontes na vida profissional”.
Inês Reis tem um caminho ainda longo para percorrer, até concluir o “major” em chinês e o “minor” em japonês que o curso oferece. Para já, é o estudo do mandarim que mais a fascina. “É incrível o que já aprendemos e a quantidade de caracteres que sabemos, nunca pensei que fosse tudo tão rápido. É uma satisfação enorme quando se começa a escrever fluentemente e só apetece saber mais, é muito cativante.” Só no final do semestre que acabou recentemente é que a parte gramatical “começou a complicar-se” mas, até agora, avalia, “estou bem”.
Com o japonês o caso muda de figura. “Desisti de fazer a cadeira este ano porque me concentrei, logo no início, no chinês e, quando me apercebi, já tinha perdido o fio à meada”. O balanço é, no entanto, positivo. “Estou a gostar da experiência.”
A par da aprendizagem dos dois idiomas, Inês Reis e os colegas têm oportunidade de estudar uma série de disciplinas que reforçam os conhecimentos sobre o Oriente. “Sabemos muito bem que a língua e a cultura são duas faces da mesma moeda e a compreensão de uma ajuda na aprendizagem da outra”, afirma Sun Lam. “O curso introduz também conhecimentos como a história, a cultura e mentalidade, a poesia, a economia e o mercado. Os objectivos são competência linguística, capacidade comunicacional e sensibilidade cultural”, sintetiza a docente.
Com uma série de possibilidades em termos de saídas profissionais, as áreas do turismo e dos negócios parecem ser as metas partilhadas pela maioria dos estudantes. A residir há quase duas décadas em Portugal, Sun Lam acredita que, no Ocidente, é crescente a noção de que o domínio da língua chinesa e a compreensão do mundo asiático são cada vez mais importantes enquanto instrumentos de trabalho em diversas áreas. “A globalização aumenta a necessidade de comunicação entre os povos e as culturas, e a China e os países asiáticos estão a fazer um papel cada vez mais importante neste processo. No futuro próximo, a maior procura será, porventura, na área de turismo. Aliás, é essa a maior motivação dos nossos alunos.”
Inês Reis confirma a análise da directora de curso e diz que, quando acabar o curso, quer apostar no turismo como profissão. E isto porque gosta de viajar, “de estabelecer contactos com pessoas de outras culturas, de conhecer e compreender outras realidades”. Daqui a três anos, se o afinco em torno dos caracteres persistir, a jovem de Braga poderá sair da secretária onde se acumulam cadernos de exercícios e livros e rumar a Oriente, à semelhança de nove colegas seus, que estão no 4º ano, e que, neste momento, frequentam universidades chinesas e japonesas.
“A Universidade do Minho estabeleceu fortes ligações com a China, através do Gabinete de Apoio ao Ensino de Chinês no Mundo, do Ministério da Educação e de universidades chinesas”, conta Sun Lam. A instituição académica está geminada com a Universidade de Línguas e Culturas de Pequim, tem a Universidade Nankai, em Tianjin, como parceira do Instituto Confúcio, e um programa de intercâmbio de professores e alunos com o Instituto de Línguas Estrangeiras de Tianjin. “Com este último estabelecimento de ensino, a Universidade do Minho colabora na sua licenciatura de português, recebendo os seus alunos do 3º ano em regime de Erasmus”, continua a professora. A UM é, aliás, a única universidade portuguesa que leva a cabo um programa Erasmus Internacional com uma instituição universitária chinesa.
Embora a licenciatura em Línguas e Culturais Orientais tenha nascido apenas em Outubro de 2004, as ligações da UM à China são já antigas. A Universidade do Minho foi a primeira do país a ter cursos livres de mandarim, iniciados em 1991, uma altura em que as duas nações estavam ainda mais longe do que agora, não obstante o factor Macau.
Embora a ligação de Portugal à China tenha séculos de existência, a sinologia entre os portugueses foi área que nunca vingou. O curso que Inês Reis frequenta não se destina à formação de sinólogos, mas também não deve ser esse o objectivo prioritário, sustenta Sun Lam. “A formação de sinólogos é uma tarefa de vida, não o objectivo de uma licenciatura”, afirma a directora do curso.
“Para ser mais realista, o que o mercado actual precisa não é de um estudioso dos clássicos e da história da China, mas de pessoas que dominem as técnicas da comunicação: comunicar fluentemente em chinês com um domínio dos códigos interlíngua e intercultura.” A formação de sinólogos no “sentido mais tradicional - para a investigação, o ensino e a tradução das obras clássicas - exige ir muito mais longe, designadamente ao nível de mestrado e doutoramento. É com este “pano de fundo e filosofia” que a Universidade do Minho vai lançar um Mestrado em Estudos Interculturais (Chinês-Português), para oferecer “a possibilidade de ajudar a realizar os sonhos dos alunos que queiram ir mais longe”.
Isabel Castro
Fotografia: António Falcão/ bloomland.cn

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