quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Quando miúdos atacam miúdos, A história de um guarda-chuva que sobreviveu à guerra

Problema da delinquência juvenil em Macau analisado por especialistas

Quando miúdos atacam miúdos

Têm entre 13 e 16 anos, mas foram capazes de arrancar as roupas, espancar e insultar uma rapariga durante seis longas horas, num vão de escada. Isto enquanto dois elementos do grupo gravavam todas as cenas de humilhação com telemóveis. O caso veio à tona há duas semanas e continua sob investigação. As autoridades suspeitam que não foi a primeira vez que a jovem estudante foi vítima de violência por parte das mesmas pessoas.
Também não foi a primeira vez que vemos o quotidiano da cidade a ser abalado por relatos semelhantes. As atitudes e os métodos podem variar, mas o nível de atrocidade e de violência ultrapassa o limite da tolerância. De todas as vezes que tal acontece levanta-se a velha questão: O que vai mal na juventude de Macau?
Na opinião do secretário-geral da Caritas, Paul Pun, as razões que podem levar os adolescentes a atentarem contra a integridade física dos seus pares prendem-se com factores essencialmente psicológicos. “Os jovens têm várias fraquezas. Não sabem lidar uns com os outros, como se devem proteger a si próprios e não pensam seriamente sobre a vida, a educação e mesmo que há consequências legais dos seus actos”, sustentou.
Neste âmbito, perante tamanha violência, é a escola e a instituição familiar que devem ser chamadas à responsabilidade. “Por um lado, os professores têm que se mentalizar que não estão ali só para ensinar, mas também para educar. Por outro, a própria comunidade tem que fazer os pais compreenderem que é necessário passar mais tempo com os seus filhos, ouvi-los e tentar compreender os seus problemas e ansiedades”, apontou.
Gertina van Schalkwyk, professora assistente de psicologia da Universidade de Macau, faz uma análise mais detalhada. “As razões que podem conduzir os adolescentes de Macau a tomar atitudes delinquentes estão ligadas a um complexo de interacção entre o indivíduo e o ambiente que o rodeia, nomeadamente a família, os seus pares, escola e outros níveis comunitários”, afirmou.
Segundo a visão da académica, na RAEM, a família e a escola são os factores de risco mais associados a condutas delinquentes. No entanto, os pares e a própria comunidade também desempenham um papel importante.
“Ser rejeitado pelos colegas devido a comportamentos anti-sociais leva, muitas vezes, a que um jovem se afilie a um grupo mais marginalizado, como é o exemplo dos gangs. Tal pode provocar uma escalada de comportamentos anti-sociais como a toxicodependência ou a delinquência”, observou.
Quanto ao ambiente escolar do território, Gertina van Schalkwyk encontrou algumas particularidades. “Muitos adolescentes passam demasiado tempo sozinhos em casa, porque os pais estão muito ocupados com o emprego. A falta de espaço dado ao convívio familiar força-os a ir para a rua, onde se encontram com outros jovens também rejeitados e negligenciados, acabando por socializar e associar-se a grupos com comportamentos desviantes”, explicou.
Menos especulação e mais trabalho de prevenção e acompanhamento. É esta a ideia defendia pela presidente da Associação de Pesquisa de Delinquência Juvenil de Macau, Penny Chan. A socióloga alerta para a existência de um terceiro grupo envolvido nestes casos de violência entre jovens ao qual é necessário prestar mais atenção.
“Grande parte destes actos de violência são depois difundidos via telemóvel ou mesmo na Internet. Temos que nos concentrar nestas pessoas que viram esses vídeos e fotografias, tentando perceber qual são as suas opiniões”, sentenciou.
Para Penny Chan, só desta forma é que é possível prevenir que novas agressões aconteçam no futuro. É preciso, segundo a responsável, discutir o assunto, explicar o que é necessário fazer para proteger a vítima e mostrar quais são as maneiras correctas de resolver um conflito.
Quanto às possibilidades de estarmos perante uma situação crónica, os observadores consultados pelo Tai Chung Pou partilham a mesma opinião: a RAEM não representa um caso especial neste contexto. “Não se pode dizer que a violência nas escolas ou entre adolescentes seja comum em Macau. Em 2006, tivemos dois casos e, no ano passado, apenas um”, defendeu Penny Chan.
Paul Pun assina por baixo. Contudo, o mesmo responsável sustentou que é preciso agir para minimizar a ocorrência de mais agressões entre jovens.
Por sua vez, Gertina van Schalkwyk é apologista da via da prevenção. De acordo com a académica, a delinquência e violência juvenil seguem um padrão muito previsível.
Além da criação de um programa de intervenção que deve ser aplicado ao primeiro sinal de problemas comportamentais e agressões, é necessário, afirmou a especialista, inserir os pais nesse esquema. Só assim, os encarregados de educação conseguirão “ajudar os filhos a adaptarem-se à vasta gama de mudanças sociais em Macau, educá-los em conformidade com isso e reduzir futuros casos de delinquência juvenil”.

O que é a delinquência juvenil?

“O termo delinquência juvenil é utilizado para definir os comportamentos criminosos cometido por menores, isto é, com idade inferior a 18 anos, e que estão relacionados com o diagnóstico clínico de conduta desviante”. A explicação é dada por Gertina van Schalkwyk, professora assistente de psicologia da Universidade de Macau.
Quando estamos a falar de adolescentes, não se menciona o conceito de comportamento criminoso, mas sim de delinquência. Por conduta desviante entende-se a repetição e persistência de um padrão de conduta que viola os direitos básicos do outro e as normas sociais comummente aceites.
Segundo a académica, a maioria dos jovens manifesta pelo menos uma forma de comportamento delinquente até atingir a idade da maioridade. Tal acção pode ter a ver com o abuso de bebidas alcoólicas e drogas, invasão de propriedade ou furto.
“Comportamento delinquente, criminalidade e violência são conceitos complexos, sendo ainda multi-determinados”, explicou a especialista. “Da perspectiva do desenvolvimento psicológico, a conclusão que se chega é que as origens da violência durante a adolescência estão firmemente enraizadas desde cedo nos comportamentos do indivíduo”.
Nas palavras de Gertina van Schalkwyk, um início precoce em termos de atitudes violentas, se não for devidamente acompanhado, pode implicar uma continuidade até à idade adulta. Visto que delinquentes juvenis são mais susceptíveis de se tornarem adultos delinquentes, observou.
Algumas pesquisas mostraram ainda que há uma especial incidência de comportamentos desviantes e actos graves de violência no pico da adolescência e no início da idade adulta. Por outro lado, este tipo de conduta é mais frequente entre indivíduos do sexo masculino do que feminino.
Alexandra Lages
Fotografia: António Falcão/ bloomland.cn

Ouvido ontem no TJB o subdirector para as Obras Públicas e Transportes

Starworld inclinado mas sem risco de queda

A causa? Não sabe. O subdirector para as Obras Públicas e Transportes, Lei Chan Fong, testemunha do caso conexo ao de Ao Man Long, que envolve os seus familiares e três empresários, afirmou ontem perante o tribunal que o edifício que alberga o hotel-casino Starworld tem uma inclinação mas não está em risco de queda. Ficaram por saber as causas de tal inclinação.
Depois de um relatório encomendado pela Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) ao Laboratório de Engenharia Civil de Macau (LECM) e à Universidade de Macau, concluiu-se que o edifício Starworld “apresenta inclinação, mas dentro dos limites estipulados por lei”. Foi a resposta de Lei Chan Fong quando inquirido pelo delegado do Ministério Público (MP). “Não havia perigo de colapso”, não tendo, por isso, sido “suscitadas melhorias”. Contudo, a vistoria a cargo do LECM deverá continuar a ser feita, afirmou a testemunha. Instruções de superiores hierárquicos não recebeu. E, garante, o relatório foi motivado apenas para responder a “rumores” de que o edifício estaria realmente inclinado. Quanto às causas, até hoje, “as Obras Públicas não sabem”. Nem mesmo o “relatório conclusivo” – que tem por base a observação, verticalidade e graus - dá respostas. Quanto a eventuais responsabilizações sobre a inclinação, o subdirector declarou que “é preciso saber a causa para saber que empresa deve ser responsabilizada”.
Contudo, acabou por afirmar tratar-se de uma questão de “assentamento diferencial” o que, trocando por miúdos, está relacionado com “o aprofundamento do pavimento – pode ser por causa das estruturas ou por outros motivos”.
Interrogado sobre os procedimentos que levaram ao licenciamento da obra, o subdirector afirmou que, recebido o relatório, foi feita uma vistoria ao local. Tendo chegado à conclusão de que o “prédio tem todas as condições para ser utilizado”, atribuiu a licença. Quanto ao futuro, afirmou, “estamos a acompanhar a evolução da inclinação”. Se eventualmente será corrigida essa inclinação, o responsável não soube dizer. “Ainda não conseguiram dar-nos uma conclusão nesse sentido”, afirmou.
Quanto às obras que envolvem os casinos Starworld, Grand Waldo ou Venetian, a testemunha negou ter alguma vez recebido uma instrução por parte do ex-secretário ou do director das Obras Públicas para “acompanhar de perto”. No que toca ao hotel-casino Starworld, disse também não ter recebido qualquer instrução da empresa Sam Meng Fai no sentido de apressar o licenciamento.
Declarações da segunda – e última – testemunha ouvida ontem no Tribunal Judicial de Base, cuja inquirição durou perto de quatro horas. A primeira testemunha do dia, Choi Tong Wa, técnico superior das DSSOPT, confirmou ter recebido instruções do superior hierárquico, quando pertencia a comissões de avaliação de concursos públicos, mas negou ter ajustado a pontuação por si atribuída – nomeadamente, no caso que envolveu a construção do auto-silo de pesados da Ponte Flor de Lótus atribuído à empresa Chon Tit.
Recorde-se que a empresa Sam Meng Fai foi a responsável pelas obras de decoração do Starworld. A acusação tem tentado provar que, dadas as ligações de Ho Meng Fai ao ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas, o empresário terá intercedido para que a entrada em funcionamento do hotel-casino fosse acelerada.
Luciana Leitão

Reunião para analisar petição de João Miguel Barros foi inconclusiva

Assembleia analisa hoje excepções feitas ao CCAC

A terceira comissão da Assembleia Legislativa deverá voltar a reunir-se hoje para analisar a petição apresentada pelo advogado João Miguel Barros, relativa às excepções que a lei concede ao Comissariado Contra a Corrupção (CCAC), no âmbito da investigação criminal.
De acordo com o deputado José Pereira Coutinho, membro da comissão responsável pela análise do documento, a reunião de ontem acabou por não ser conclusiva, não tendo havido tempo necessário para estudar detalhadamente a pretensão do advogado de Macau.
Assim sendo, adiantou Pereira Coutinho ao Tai Chung Pou, “deverá haver esta quarta-feira uma nova reunião, para que seja possível estudar a petição aprofundadamente, dentro do prazo legal”.
No passado mês de Dezembro, João Miguel Barros solicitou à Assembleia Legislativa, ao abrigo do direito de petição, que se pronunciasse sobre a constitucionalidade da Lei 10/2000, que estabelece um regime de excepção a favor do CCAC, relativamente à regra geral que está consagrada no Código de Processo Penal, e que permite ao organismo não estar sujeito a nenhum prazo para concluir as investigações.
Para o advogado, esta excepção permitida por lei afronta princípios constantes da Lei Básica e do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, em vigor em Macau. Recordando que o CCAC é uma entidade de polícia criminal, não podendo ser equiparada a autoridade judiciária (como o Ministério Público) e que, no início ou no decurso dos inquéritos abertos pelo CCAC os investigados podem ser constituídos arguidos, João Miguel Barros sublinhou que “a constituição de arguido acarreta normalmente a aplicação de medidas restritivas da liberdade individual ou de medidas especialmente gravosas em termos patrimoniais”.
Ora, a excepção prevista na Lei 10/2000 “pode levar, na prática, a que o CCAC constitua um arguido no início ou no desenvolvimento do inquérito e mantenha a pessoa investigada nessa condição de arguida durante o tempo que quiser, não estando sujeito ao prazo geral de oito meses estipulado no Código de Processo Penal para a sua conclusão, que se aplica às situações em que não haja arguido preso preventivamente”.
Na passada semana, à margem do debate de três dias sobre o processo penal em Macau, foram vários os advogados que concordaram com a interpretação de João Miguel Barros em relação a estas excepções concedidas ao CCAC.
Isabel Castro

Empresa de Hong Kong com 122 anos insiste na diferença

A história de um guarda-chuva que sobreviveu à guerra

Nos tempos que correm, são raros os produtos com garantia vitalícia que se encontram à venda no mercado. Em Hong Kong, existe uma excepção: por pouco mais de 120 patacas, é possível comprar um guarda-chuva para a vida inteira. Desde 1885 que a promessa de qualidade a rondar a eternidade é feita pela empresa Leung So Kee, uma pequena indústria que chegou a ter grande prestígio a nível internacional. Decorrido mais de um século de trabalho, a Leung So Kee depara-se com novos desafios: com apenas duas lojas e sem estratégia de marketing, não tem sido fácil manter o negócio.
O percurso desta marca emblemática de Hong Kong passou a ser conhecido, entre os habitantes da antiga colónia britânica, como a “História do Guarda-Chuva”, depois do escritor To Kwok-wai ter construído uma peça de teatro a partir da vida das três gerações da Leung So Kee. A crítica aplaudiu unanimemente o trabalho de encenação, dado o seu forte lado humano, mas a peça de teatro não representa com objectividade a história de um negócio familiar com 122 anos de existência.
“Tanto a peça como o livro não são rigorosos. Por exemplo, mencionam que o fundador teve dois filhos, mas isso não é verdade”, conta Leung Mang-sing, director da Leung So Kee, bisneto do fundador.
A história da Leung So Kee começa na China imperial do final do século XIX, quando ao porto de Cantão chegavam os barcos de comerciantes vindos do Ocidente, época em que o chá e o ópio eram os produtos mais comercializados nas águas do sul da China. O fundador da Leung So Kee, de seu nome Leung Chi-wa, recolhia ferro-velho para revenda, sendo esta a sua actividade principal. Até que, um dia, reparou que os ocidentais não tinham ninguém que fizesse trabalhos de reparação dos modernos guarda-chuvas, estragados pelos ventos fortes sentidos na zona costeira. Leung encontrou aí uma oportunidade de negócio e começou a reparar peças estragadas de estrangeiros.
A técnica de construção e de reparação foi aprendida com artesãos ocidentais de passagem pela China. Leung fez o seu primeiro guarda-chuva e escolheu um nome para o produto do se trabalho: Leung So Kee tem na origem o nome pelo qual o fundador era tratado na escola, Leung So. Em 1885, na cidade de Cantão, nascia a empresa. O slogan escolhido adequava-se às exigências do consumo da época - uma boa estrutura de metal e a promessa de garantia vitalícia.
O negócio foi crescendo e, corria a década de 1920, foram abertas mais duas lojas: uma em Macau, a outra em Cantão, onde já estava instalado o estabelecimento comercial que deu origem ao produto. Os guarda-chuvas pretos de grandes dimensões começaram a ser também conhecidos na então República da China, com os níveis de popularidade a crescerem a olhos vistos.
No século XXI, o produto mais emblemático da Leung So Kee continua a ser especial a nível mundial e muito procurado por turistas. Os ingleses continuam a preferir o clássico guarda-chuva preto com a pega feita de bambu. Hoje em dia, explica o responsável pela empresa, são mais leves do que os originais, feitos de materiais resultantes das inovações tecnológicas. Se bem que a imagem da marca é a cor preta, a empresa aceita pedidos especiais de quando em vez, como os guarda-chuvas com a imagem do “ground zero” estampada, Manhattan depois de 11 de Setembro de 2001, por encomenda de um norte-americano.
A experiência adquirida à frente da Leung So Kee permite ao director traçar os diferentes perfis dos consumidores. “Os japoneses compram diferentes chapéus, uns para a chuva, outras para os dias de sol. Já os residentes de Hong Kong preferem um produto prático, que seja leve, de pequenas dimensões e resistente às rajadas de vento”, explica. Por isso, o guarda-chuva mais vendido de sempre da marca foi um modelo preto retráctil, em tudo distinto do clássico chapéu com pega de bambu.
Actualmente, só existem duas lojas onde é possível comprar um guarda-chuva da Leung So Kee: uma fica em Kowloon, a outra está localizada nos Novos Territórios. A existência destes dois estabelecimentos tem uma explicação histórica. Os bons tempos de Cantão não duraram muito. Na década de 1930, a guerra levou a instabilidade a Cantão e o fundador da empresa teve que tomar decisões em relação à viabilidade do seu negócio. Leung Chi-wa, pai de uma numerosa família, optou por uma solução tradicional, tendo passado a empresa aos seus descendentes.
O filho mais novo era demasiado jovem para começar a trabalhar, pelo que Leung lhe deu dinheiro suficiente para sobreviver aos tempos de guerra. O fundador da empresa dividiu o espólio pelos três filhos mais velhos, seguindo uma lógica geográfica: as lojas da China e de Macau para um, os estabelecimentos dos Novos Territórios e de Kowloon para outro, sendo que ao terceiro coube em sorte o negócio na ilha de Hong Kong.
A actividade empresarial fora de Hong Kong não sobreviveu à guerra, mas as lojas da Leung So Kee em ambos os lados do Victoria Harbour evoluíram de forma próspera no cenário económico do pós-guerra. O primeiro guarda-chuva retráctil da empresa nasceu em 1949.
O facto de os guarda-chuvas serem feitos de forma artesanal e a qualidade dos materiais fizeram com que fossem objectos em voga durante os anos 1960. Nessa altura, o produto mais barato da Leung So Kee custava 9 dólares de Hong Kong, enquanto o mais caro chegava aos 420 dólares, o equivalente a vários meses de salário de um trabalhador da classe média.
O produto de luxo adaptou-se às novas tendências de mercado, com o preço actual fixado nos 120 dólares de Hong Kong. Já não são totalmente feitos por artesãos, mas continuam a ser montados por uma mão cheia de famílias da antiga colónia britânica. Há mais de trinta anos, este era um tipo de tarefa que permitia a sobrevivência a muitas famílias migrantes do território.
Leung Mang-sing explica que este método de confecção permite um melhor controlo de qualidade, mas o factor económico também pesa, uma vez que a produção em massa de guarda-chuvas, que são depois vendidos a 10 dólares, colocou a Leung So Kee numa frágil posição em termos de mercado.
“Antigamente era possível encontrar bons guarda-chuvas na Daimaru e na Matsuzakaya”, diz o director, fazendo referência a duas lojas japonesas que fecharam as portas. “Agora, só há à venda produtos muito baratos, de má qualidade, ou então chapéus cujo preço ultrapassa os mil dólares de Hong Kong.” Curiosamente, a Leung So Kee também faz trabalhos de reparação em guarda-chuvas de outras marcas. Como os seus ascendentes, Leung Mang-sing aprendeu os segredos do produto.

Planos para o futuro

De forma distinta de outras marcas da concorrência, a Leung So Kee só produz guarda-chuvas, apostando na qualidade e numa forma de produção com muitos custos. A competição começou a fazer-se sentir na década de 1970, com a explosão da indústria na Ásia. Em 1986, a loja na ilha de Hong Kong fechou as portas. Contas feitas e sem dívidas para pagar, a história deu origem a um livro, a uma peça de teatro e a um filme. As únicas sobreviventes desta empresa com mais de um século passaram então a ser as lojas em Kowloon e nos Novos Territórios.
De acordo com as contas de Leung Mang-sing, a empresa vende entre 30 mil a 50 mil guarda-chuvas por ano, o que faz com que o negócio seja ainda rentável, não obstante a garantia vitalícia dos produtos. Cerca de quarenta por cento dos chapéus de chuva voltam para a fábrica, para serem reparados, pelo que é necessário manter materiais para compor produtos com mais de quarenta anos. O objecto mais antigo da Leung So Kee é um guarda-chuva de 90 anos, que em tempos pertenceu a uma senhora de idade avançada, e que agora se encontra no Museu de História de Hong Kong.
Os produtos da Leung So Kee já estiveram disponíveis num espaço comercial de Macau, mas a empresa prefere vender os guarda-chuvas apenas nas suas lojas, dada a “falta de honestidade” dos revendedores. “O que aconteceu foi que misturavam cinquenta chapéus de chuva fabricados na China, de má qualidade, com cem dos nossos, e diziam aos clientes que eram todos da Leung So Kee”, conta o director.
O nome da empresa é desconhecido entre as gerações mais novas mas, ainda assim, há algumas excepções. Uma mãe foi comprar um guarda-chuva para o seu filho, a estudar em Inglaterra. A ideia não partiu da progenitora, mas sim do descendente, que soube da marca através de um amigo ocidental da escola que frequenta.
Sem uma estratégia de marketing nem meios de produção que lhes permita fazer frente às marcas conhecidas a nível internacional, a Leung So Kee continua a confiar no facto de ter uma história e de ser um símbolo de Hong Kong. Mais do seguir as tendências de um mercado em constante mutação e de criar estilos atraentes para os jovens, Leung Mang-sing pensa, agora, em abrir uma loja em Central, o que implicará negociações com a família que herdou o negócio nessa margem. “Há pessoas que nos perguntam se temos lojas na ilha de Hong Kong, porque não lhes dá jeito atravessarem até este lado”, conta o director. “Por isso, queremos abrir mais uma duas lojas nos próximos tempos, para podermos servir melhor os nossos clientes.”
Kahon Chan, em Hong Kong,
com Isabel Castro

Sem comentários: