segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Inexistência de meios para recurso foi decisão política, Macau Contactos, Sobreviver em Tin Shui Wai

Inexistência de meios para recurso foi decisão política

As linhas ténues da Lei

Continua por resolver o principal imbróglio jurídico em torno do julgamento do ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas, isto quando o processo a decorrer no Tribunal de Última Instância (TUI) entra, esta semana, na sua fase final, com as alegações marcadas para a próxima quarta-feira.
Desde o início do julgamento que uma questão de ordem jurídica tem ensombrado o caso: a inexistência de meios processuais para garantir o direito “básico” ao recurso, tanto ao arguido como à própria acusação. A Lei Básica assegura a existência de, pelo menos, um grau de recurso, mas tanto a Lei de Bases da Organização Judiciária da RAEM como o próprio Código do Processo Penal de Macau não contemplam instrumentos processuais para garantir ao arguido (ou à acusação) a execução desse direito, nos casos em que o julgamento em primeira instância decorre no TUI.
No meio jurídico de Macau, o problema tem sido amplamente debatido, com várias possibilidades a serem colocadas em cima da mesa. Desconhece-se, todavia, qual será a forma de resolução do problema pelo próprio TUI que, de acordo com o Código Civil, não pode abster-se de julgar, invocando a falta ou obscuridade da lei. A defesa já recorreu de uma decisão tomada pelo colectivo que avalia o caso de Ao Man Long, estando ainda à espera do despacho de admissibilidade do TUI, no qual tem que ser indicada a instância para a qual sobe o recurso.
Acontece que esta situação de difícil resolução, que parecia ser resultante de uma omissão do legislador, é, afinal, consequência de uma decisão de natureza política. O Tai Chung Pou sabe que, em 1999, aquando da discussão e aprovação da Lei de Bases da Organização Judiciária (Lei n.º 9/1999, em vigor desde o dia 20 de Dezembro do mesmo ano) pela Assembleia Legislativa (AL), a questão foi amplamente debatida, com um sector do hemiciclo a chamar a atenção para o facto de não estarem definidas as formas de assegurar o recurso.
A posição destes deputados, pertencentes à 1ª Comissão de Trabalho, ficou expressa no parecer nº 3/1999, datado de 13 de Dezembro de 1999. O ponto 12º deste documento deixa também bem clara a vontade contrária, que acabaria por vingar. "Houve quem defendesse que às causas previstas nas alíneas 7), 8) e 10) do nº 2 do artigo 43º, seja aplicado o mecanismo previsto no nº 2 do artigo 44º, a fim de dotar os interessados do direito de recurso. Houve, porém, quem entendesse que, tratando-se de ‘Última Instancia’, não deve haver recurso”, lê-se no parecer.
Este mecanismo ao qual é feita referência consistia em chamar o presidente e o juiz mais antigo em exercício de funções no Tribunal de Segunda Instância que não se encontre impedido ou, neste caso, o juiz seguinte na ordem de antiguidade, para conjuntamente com os três juízes do TUI, decidirem definitivamente o caso. Embora esta solução pudesse também suscitar dúvidas em termos jurídicos, certo é que o problema foi levantado, sendo igualmente verdade que houve quem achasse que as decisões do TUI, mesmo julgando em primeira instância, não deveriam ser questionadas.
O imbróglio que parecia ser consequente de uma lacuna de ordem jurídica passa assim a ser, claramente, o resultado de uma decisão política: existe uma deliberação da Assembleia Legislativa, sob proposta do Governo, no sentido de não conceder o direito ao recurso aos titulares de altos cargos políticos da RAEM.
Na altura, esta posição não parece ter sido questionada ao ponto de chegar à praça pública mas, volvidos oito anos e perante um caso concreto, vários juristas ouvidos pelo Tai Chung Pou não têm dúvidas em afirmar que esta determinação política carece do suporte jurídico concedido pela Lei Básica.
O direito a uma instância de recurso da decisão judicial condenatória ou absolutória, em matéria penal, é um direito fundamental (quer para o cidadão quer para o Estado, enquanto garante da ordem pública), que já existia no ordenamento jurídico de Macau antes da transferência da Administração, e continua em vigor, através do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, para o qual a Lei Básica remete. Se o princípio da imutabilidade por cinquenta anos está consagrado e garantido por um tratado supranacional, a Declaração Conjunta Luso-chinesa, não existe, para os especialistas consultados pelo Tai Chung Pou, base jurídica ou política que possa sustentar posição contrária, ou seja, a inadmissibilidade do recurso.
Este problema foi levantado pouco após a detenção do ex-secretário para os Transportes e Obras Públicas mas, durante estes meses, a discussão tem-se limitado às páginas dos jornais e aos círculos de juristas, com o Governo, nomeadamente o Gabinete da secretária para a Administração e Justiça, a não revelar publicamente intenções de corrigir, por via legislativa, esta “omissão”, que só poderá ser alterada através de lei.
Na fase final do julgamento mais mediático do Macau pós-RAEM, resta então saber qual o caminho que os juízes vão escolher para garantirem os meios do exercício do direito ao recurso, sob pena de, se tal não acontecer, a RAEM não poder agir contra uma sentença que lhe pareça injusta ou desadequada, o mesmo se aplicando ao cidadão que se julgar injustamente condenado.
Isabel Castro

Novos estagiários de programa do AICEP

Em contacto com Macau

O destino de um ano das vidas de Marta Órfão, João Roque e Pedro Campos foi decidido, em apenas um dia, “no meio da serra”. Não foi fácil o processo de descoberta das colocações do programa INOV Contacto para o ano 2007/2008, pelo menos do ponto de vista dos futuros estagiários.
Este ano, foi tudo organizado de uma forma mais descontraída, por via de jogos e actividades lúdicas. Durante a manhã, após a concretização de cada tarefa, os candidatos recebiam letras que, depois de um exercício semelhante às palavras cruzadas, lhes permitia descobrir o nome da empresa onde estavam colocados.
Para a tarde ficou reservada, no entanto, a localização do estágio. Aí, a diversão deu lugar à ansiedade. O chefe de cada equipa teve que descobrir escondidas nas árvores as listas dos resultados.
Uma das características deste projecto coordenado pela Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP) para jovens em início de carreira é o facto de os candidatos serem enviados de forma aleatória para qualquer ponto do globo. Este ano, a sensação de roleta russa do INOV Contacto atingiu o seu máximo de adrenalina. Foi um teste aos nervos dos mais calmos.
“Não achei piada nenhuma”, recorda Marta Órfão, 26 anos, estagiária colocada em Macau, na empresa de produtos farmacêuticos Hovione. “Aquilo seguia uma ordem para cada grupo, estávamos ali à espera e, quando eles começavam a gritar lá do meio, não conseguíamos perceber”, acrescenta. Uma situação que hoje já conta com um sorriso desenhado nos lábios.
Mesmo assim, a licenciada em engenharia química, natural de Leiria, não esperou muito para saber qual o seu rumo. A sua equipa foi a terceira a conhecer o resultado das colocações. Sabendo que era na Hovione que ia ficar, a leiriense tinha apenas duas hipóteses: Nova Jérsia, nos Estados Unidos, ou Macau. A distância não era um problema para Marta Órfão que tinha uma preferência pela RAEM. “Eu queria tudo menos Espanha, para quanto mais longe melhor. Aquilo que eu procurava era a maior diferença cultural possível”, sublinha.
A empresa farmacêutica já recebe estagiários de Portugal há mais de uma década. Aqueles que estão quase a partir servem sempre de anfitriões dos novatos. É um ciclo que diminui o impacto de quem acaba de chegar com a nova morada e todas as diferenças que isso acarreta.
Quando ouviu Macau, Marta ficou duplamente “contente”. “Sabia que já tinha estado aqui mais gente. É sempre bom ter conhecimento das suas experiências. Além disso, a adaptação é mais fácil, por causa da cultura portuguesa que ainda aqui existe”, observa.
China era a localização que estava escrita ao lado do nome de Pedro Campos. Foi um momento de alguma baralhação para o engenheiro químico de 25 anos, que já tinha na ideia que o seu destino era o território. “Pensava que era Macau, porque foi o que também calhou à Marta”, conta. No final das contas, tratou-se apenas de uma pequena imprecisão.
O jovem decidiu deixar em suspenso um projecto de uma bolsa de investigação da Universidade de Coimbra e uma empresa da Figueira da Foz para abraçar a aposta no INOV Contacto. “Estava farto daquele tipo de rotina. Queria mudar de ares e experimentar coisas diferentes e esta iniciativa é bastante vantajosa para o nosso currículo e carreira profissionais”, salienta o residente da cidade dos estudantes.
A tarde na serra de Braga foi mais longa para João Roque do que para os companheiros Contacto também colocados no território. O engenheiro civil de 25 anos estava incluído nos últimos grupos a conhecerem o país no qual iam estagiar. Mal soube que vinha para Macau “foi uma explosão de alegria e o nível de satisfação foi de 100 por cento”, recorda. São poucos os continentes que são estranhos para o jovem natural do Funchal, na ilha da Madeira. O percurso académico levou-o à América do Sul, à outros destinos da Europa e também conhece bem África.
Após ter completado os estudos do grau de mestrado em Roma, Itália, dominava-o uma vontade de conhecer “o outro lado do mundo”. A RAEM revelou-se o destino perfeito. A decisão de participar no programa do AICEP não foi, contudo, tomada simplesmente “um dia ao acordar”.
O destino mais provável para os engenheiros civis que participam neste programa é o continente africano. Algo que fez nascer algumas dúvidas no madeirense antes de dar um passo em frente na candidatura. “Já tinha andado por lá e não era o meu local preferido para estagiar”, salienta. “Nem sabia que em engenharia civil se vinha cá ter. Nunca tinha ouvido falar”, acrescenta.
De facto, a Profabril, empresa local que recebeu João Roque, é menos experiente nesta andanças do que a Hovione. O grupo de construção civil só acolhe estagiários de Portugal há quatro anos. A opção acabou por ser feliz para o jovem português. “No primeiro emprego em Portugal, de certeza que não estava a trabalhar com obras de tão grande envergadura”, afirma.
Crescer profissionalmente é a maior ambição do trio português. Ainda com poucas semanas de Macau, praticamente acabados de chegar, são mais as expectativas do que as constatações quanto à experiência de viver e trabalhar no território. Quais serão as vantagens de estagiar em Macau? E as desvantagens? “Ainda é muito cedo para responder”, dizem. “Talvez daqui a cinco meses”.

Apoiar jovens em início de carreira

Conhecer uma cultura diferente, oferecer a possibilidade de uma carreira profissional internacional e contactar com a realidade empresarial nacional. São estes os principais objectivos do programa INOV Contacto. Uma iniciativa que promove a realização de estágios internacionais para jovens portugueses, que conta com o apoio da União Europeia, sendo gerido e coordenando pela Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP).
Este projecto está inserido nas medidas contempladas pelo Plano Tecnológico do Governo de Portugal. Por isso, é financiado pelo Ministério português da Economia e da Inovação. Os candidatos devem responder a uma série de requisitos e têm que ultrapassar no mínimo duas fases.
O programa está dividido em três fileiras, que correspondem às diversas áreas profissionais. A primeira, a Tecnológica, corresponde às novas tecnologias, informática, engenharia, matemáticas aplicadas, economia, gestão e comunicação social. É nesta fileira que estão incluídos os estagiários de Macau, Marta Órfão, João Roque e Pedro Campos.
A fileira Sectorial diz respeito à indústria têxtil, vestuário, calçado e turismo. Já a Técnica é a mais abrangente, incluindo as áreas de hotelaria, gestão de operadores turísticos, telecomunicações, novas tecnologias e informação, técnicas comerciais/distribuição, gestão ambiental, administração, recursos florestais, ambiente, sistemas agrícolas, equinicultura, gestão de transportes e recursos marítimos.
Pode participar no INOV Contacto quem tiver uma idade inferior a 35 anos, com o curso de licenciatura completo. Além disso, os jovens devem ser fluentes em português, inglês e numa terceira língua.
Ainda em Portugal, todos devem frequentar um curso de Gestão Internacional, com duração de duas semanas. Depois, e antes da aventura internacional, os participantes podem ainda estagiar numa empresa em terras lusitanas, não sendo obrigatório para todas as fileiras sectoriais. A designação do local para onde se devem deslocar os candidatos é apenas conhecida no final do curso de Gestão Internacional.
Durante o período de estágio no estrangeiro, os participantes têm direito a uma bolsa mensal, subsídio de alojamento e alimentação, viagem de ida e volta, bem como uma série de seguros de acidentes de trabalho, saúde, actos de guerra, terrorismo e perturbação da ordem pública.

Menos vagas, nova edição

O programa de estágios INOV Contacto completa este ano a sua décima edição. Na etapa de 2007/2008, registam-se algumas alterações em relação ao ano passado. A mais drástica diz respeito ao número de vagas que, de 190, passou para 88. No entanto, nem tudo são más notícias, já que se avizinha uma nova edição da iniciativa a realizar-se em meados do próximo ano.
De acordo com dados da Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP), as áreas com especial focalização das novas tecnologias são aquelas que preenchem mais vagas. Relativamente à formação dos estagiários, a gestão é a actividade profissional que lidera a tabela com 26 por cento de ocupação de vagas, seguida da economia (21%) e das engenharias (15%).
Quanto à nova edição do programa ainda não existem dados em concreto. Apenas se sabe que terá um enfoque semelhante ao programa INOV Contacto e vai ser objecto de candidatura ao Programa Operacional Potencial Humano do Governo português. Ao longo de 10 edições, o programa INOV Contacto recebeu 25.504 inscrições, das quais 1552 candidaturas foram aprovadas.
Alexandra Lages
Fotografia: António Falcão/ bloomland.cn

Comunidade de Tin Shui Wai aposta em serviço de entreajuda

Saber dar as mãos

É uma das zonas mais problemáticas de Hong Kong e tem dado que falar nos jornais da região vizinha. Recentemente, oito centenas de residentes da cidade satélite de Tin Shui Wai saíram para a rua para reivindicar melhores condições de vida no local e transportes mais acessíveis para área central da antiga colónia britânica.
Numa comunidade que enfrenta diversos problemas sociais, um grupo de mulheres encontrou uma forma simples mas eficaz de lutar contra um ambiente frequentemente marcado por atitudes de desespero. O projecto que abraçaram tem já mais de um ano de existência e resultados visíveis.
Localizado no ponto mais a norte da cidade satélite, a maioria dos apartamentos do complexo Tin Heng têm vista para Shenzhen – quando o tempo está bom, os residentes conseguem ver, à noite, os espectáculos de fogo-de-artifício que decorrem na cidade chinesa. A vista dos apartamentos é, no entanto, irrelevante para famílias que não conseguem pagar uma renda superior a três mil dólares de Hong Kong por mês. A falta de infra-estruturas no local e a sensação crescente de exclusão social fazem com que estas famílias de Tin Heng sofram de problemas de variadas ordens.
Entre estas donas de casa desesperadas, encontrava-se Ada Ng, natural de Pequim. A viver em Hong Kong desde 1995, só aí se apercebeu que o casamento que vivia à distância era um ilusão: as diferenças de idade e culturais tornaram-se mais fortes e as palavras meigas deram lugar a discussões contínuas. Em 2002, quando a família se mudou para os apartamento de Tin Heng, a situação piorou.
A visita de um grupo de voluntários e de uma assistente social revelou-se providencial, conta Ada, para que conseguisse sair do tormento. “Quando me visitaram a primeira vez, claro está que não lhes contei todos os meus problemas, precisava de avaliar se me queriam realmente ajudar.” Convidada a participar nas actividades organizadas pelo novo centro de serviços sociais instalado no bairro, decidiu aceitar. “Pensei que se fosse ver o que poderia fazer no centro seria melhor do que ficar em casa a sentir-me ‘estranha’. De resto, também não tinha mais nada que fazer.”
Judy Pang Ah-chu, líder do projecto de apoio social de Tin Heng, explica que Ada era um dos casos críticos que precisavam de visitas ao domicílio frequentes e aconselhamento em continuidade. Uma mulher mais feliz, Ada é agora uma das 33 “embaixadoras da ajuda” no âmbito da iniciativa de apoio social – um grupo que recebe formação e realiza visitas organizadas a famílias de risco. Além disso, dá ainda aulas de culinária de Pequim.
Utiliza a sua experiência de forma vantajosa, uma vez que sabe quais são as necessidades de pessoas que se encontram psicologicamente frágeis. “Quando estava no meu período difícil, conseguia ter força se alguém me apoiasse, mas se houvesse gente que questionasse, à minha volta, as razões de estar vivo, era a primeira a querer deixar de viver”, recorda.
O projecto da responsabilidade do Hong Kong Christian Service surgiu na sequência de uma tragédia familiar ocorrida em 2004 naquele conjunto de apartamentos. Um ano depois, o centro decidiu criar um espaço em Tin Heng e experimentar um projecto de ajuda em rede, de modo a criar laços entre a vizinhança e a fomentar o espírito de entreajuda numa zona que se encontra esquecida e abandonada, dada a sua remota localização.
Até ao final de Outubro passado, tinham sido acompanhadas, através de visitas ao domicílio, mais de noventa famílias. Judy Pang acredita que o valor do projecto não se avalia pelo número de famílias envolvidas. “Esperamos que influenciem as pessoas que estão à volta delas”, vinca.
A rede de ajuda não acompanha apenas famílias e casais infelizes. Jane Ng mudou-se para Hong Kong há sete anos e a sua vida tem sido relativamente mais fácil do que a de Ada, embora igualmente cinzenta depois de passar a viver no bairro. Nos primeiros anos, Jane conseguia dizer apenas algumas palavras em cantonês e não tinha com quem partilhar o que sentia. “No início foi muito difícil... Tomava conta dos meus filhos, ia ao mercado, cozinhava. E era assim dia após dia.” Os primeiros contactos que teve em Hong Kong – e, mais tarde, as primeiras amizades – surgiram depois de se ter juntado ao projecto comunitário. Agora, tem uma vida social activa e apoia mulheres que chegam da China a resolverem questões do quotidiano como levar os filhos ao médico e comprar o material escolar. “Não fazem a mínima ideia de como se movimentarem”, explica.
Enquanto estas donas de casa trocam receitas e dicas acerca da educação dos filhos, Jane aprendeu também que o que sentia não era exclusivamente seu. “No passado, via tudo negro mas, agora, sou capaz de encontrar o lado positivo.” Feitas as contas, os amigos que fez são aquilo que considera mais valioso. “Imagine que chega aqui e não conhece ninguém... Sem amigos ninguém é feliz. Não há nada melhor do que uma boa amizade.”

Sinais de vida

O conjunto de apartamentos Tin Heng e o complexo vizinho Grandeur Terrace foram construídos ao abrigo do plano de casas económicas da Autoridade da Habitação. Este projecto de apoio social começou a ser desenvolvido em 1978 e tem, como objectivo, ajudar famílias carenciadas a adquirirem habitação própria a preços acessíveis. Este tipo de apartamentos seguem, por norma, padrões simples, tanto no exterior como no interior, que permitem diminuir os custos de construção.
O número de habitações económicas conheceu um momento de grande crescimento em 1997, quando o então Chefe do Executivo Tung Chee-Hua definiu que o plano deveria possibilitar a aquisição de 85 mil novos apartamentos por ano. No entanto, as intenções do Governo coincidiram, infelizmente, com a crise asiática, e em 1998 deixou de se ouvir falar na habitação económica. Em 2001, alguns destes apartamentos foram transferidos para o plano de habitação social, destinado ao arrendamento, sendo que os complexos Tin Heng e Grandeur Terrace se enquadram neste reaproveitamento de recursos imobiliários.
As unidades destinadas à habitação económica apresentam, por norma, melhores características de construção do que as habitações sociais, uma vez que se destinam à comercialização. No entanto, por serem concebidas para famílias com posses mais elevadas do que as que ocupam as habitações sociais, não estão dotadas com equipamentos e infra-estruturas de apoio social. Os agregados familiares com rendimentos baixos, incluindo um grande número de migrantes da China, deparam-se frequentemente com dificuldades, depois de ocuparem casas em locais remotos onde não têm qualquer ajuda para resolver problemas de índole doméstica.
Judy Pang explica que, embora o centro social de apoio às famílias que dirige esteja integrado no complexo Tin Heng, a maioria dos residentes não se apercebe da sua existência. Além disso, os que têm necessidades especiais não se encontram motivados, por norma, para pedir apoio.
Os quartos de pequenas dimensões ocupados pelo Hong Kong Christian Service não foram feitos propositadamente para acolher um centro – na realidade, não havia nenhum serviço deste género até 2005. Por outro lado, os dois andares destinados ao parqueamento automóvel encontram-se abandonados, pelo que foi anunciada recentemente a intenção de reconversão do espaço para que possa ser instalado um centro de apostas do Hong Kong Jockey Club, o que trará mais oportunidades de emprego aos residentes da área.
A população desta cidade satélite queixa-se do isolamento a que está votada, devido ao elevado custo de transportes para as zonas centrais de Hong Kong. A falta de infra-estruturas básicas, como creches e um hospital, esteve na origem de um protesto na rua levado a cabo no mês passado.
Kahon Chan, em Hong Kong, com Isabel Castro

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