Por uma melhor comunicação
Existem nove terapeutas da fala no território, um número “insuficiente” face aos habitantes de Macau. Tendo criado uma associação no passado dia 24 de Novembro, estes profissionais juntaram-se para sensibilizar Governo e associações para a necessidade de mais terapeutas. Ainda a pensar no plano para o próximo ano, Tommy Ian, presidente do organismo, adiantou que “um dia de promoção de saúde na voz ou de diagnóstico gratuito a crianças” são hipóteses viáveis.
Pensando em Hong Kong, em que “o número de terapeutas ascende aos 700 para uma população de sete milhões”, Tommy Ian não deixa de salientar que Macau fica muito atrás. “Somos nove para 700 mil pessoas – claramente há falta de profissionais”, declarou. Porquê? “É entendimento comum enraizado que quando as crianças não sabem falar, mais vale esperar. Ou então que tomando medicamentos ou recorrendo à medicina chinesa, tal venha a acontecer. No caso dos idosos que, por exemplo, sofreram uma trombose e deixaram de falar, as pessoas dizem que é o destino”, explica Tommy Ian. Uma falta de preocupação que se estende a organismos oficiais e ao Governo.
Mas o presidente da Associação dos Terapeutas da Fala de Macau (MAST em inglês) realça a importância da terapia da fala. “Ajudamos crianças com problemas de fala, deglutição, aprendizagem e articulação, dislexia, síndroma de Down, para além de idosos que sofreram uma trombose tendo perdido a capacidade de comunicação, ou adultos com problemas de articulação e gaguez”, declarou. E através da terapia da fala, “pode fazer-se a diferença na qualidade de vida das pessoas”.
Dos nove profissionais a actuar no território, apenas Tommy Ian trabalha numa clínica privada. “Seis trabalham na Direcção dos Serviços de Educação e Juventude, um trabalha no Instituto de Acção Social e outro no Centro Hospitalar Conde São Januário – apenas dois destes lidam com idosos e adultos”, conta. Por isso, defende, “talvez se possam recrutar mais profissionais de Taiwan ou Hong Kong”.
Tendo em conta que a principal área de intervenção são as crianças, os métodos usados são especiais. “Primeiro falamos com as crianças e os pais, vemos qual a dimensão do problema e usamos brinquedos e jogos para pô-los mais à vontade”, explica. Sempre através da diversão. Mais difícil é trabalhar com idosos, porque “alguns deles, depois de uma trombose, podem ter problemas de compreensão e não mexer os músculos faciais – precisamos de avaliar a capacidade de escrever e ler”. Mas, mais importante, é “lidar com as emoções, porque muitos deles têm depressões”.
Macau é um local especial, dado o cruzamento de culturas. E é porque existe essa interculturalidade que “os profissionais que actuam em Macau são de Hong Kong, Taiwan e Portugal”. No total, acabam por comunicar em mandarim, cantonês, inglês e português. E quanto a uma eventual barreira cultural? “Para alguns terapeutas pode existir, mas desde que gostes de crianças, e que saibas qual o seu brinquedo favorito, é fácil trabalhar”. Algo que também “depende dos pais”. Mas, mais importante do que superar barreiras culturais, “são as competências”, afirma.
A terapia da fala incide a sua actividade no tratamento. No que toca à prevenção, pouco se pode fazer quanto a doenças crónicas. Mas o mesmo não se pode dizer no que “toca a profissionais, como professores ou vendedores, que usam demasiado a voz, podendo sugerir-se formas de abusar menos”. No que toca aos problemas de linguagem das crianças, a prevenção pode passar por “sugestões aos pais sobre como interagir melhor, de forma a ajudar”.
Natural de Hong Kong, falando um inglês fluente, aos 27 anos, Tommy Ian só chegou a Macau em 2004, estando actualmente a trabalhar para uma clínica privada e para a escola da Concórdia. “Gosto de brincar e interagir com crianças. Quanto aos adultos, gosto de ensiná-los a lidar com as suas dificuldades. Para quem gosta de interagir e ajudar, a terapia da fala é a melhor opção”, concluiu.
Uma terapeuta portuguesa
Carla Luz Silva, 35 anos, é terapeuta da fala em Macau. Natural do território, trabalha principalmente com crianças dos seis aos 15 anos. Lidando com meninos naturais de Macau, portugueses ou filipinos que se deparam com problemas de aprendizagem do português, o principal obstáculo ao seu trabalho é a “falta de livros de estudo e testes na língua lusa”, recorrendo, por isso, aos de língua inglesa. E nem sempre se adequam. É o caso dos chamados testes de articulação – “existem fonemas na língua portuguesa que não existem em inglês”.
Mas a maioria dos problemas que batem à porta de Carla Luz Silva passam por “problemas de articulação”. Tratam-se de crianças encaminhadas pelas educadoras, depois de dois anos em que se verifica um “fraco domínio do português”. Cabe depois à terapeuta averiguar se “têm pouco domínio da língua ou se existe alguma dificuldade de aprendizagem”. Contudo, dado que são bilingues, torna-se difícil averiguar a fonte do problema. “Muitas vezes os pais não falam em português com os filhos em casa, deixando essa tarefa para a escola, mas na escola fala-se cantonês, inglês e português”, explica. Daí resulta a dificuldade em perceber se existe um “mau domínio da língua” ou “problemas de aprendizagem”.
Luciana Leitão
Fotografia: António Falcão/ bloomland.cn
Fotografia: António Falcão/ bloomland.cn
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