Mantém-se o efeito dissuasor?
O panorama que se apresentava mais animador no fim de Outubro, deixou de o ser terminado o mês de Novembro. E se, segundo os números dos Serviços de Estatística e Censos, em Outubro se registou um decréscimo de quase dois terços no que toca ao número de infracções de menor gravidade detectadas pelas autoridades, o mesmo não se pode dizer em relação a Novembro, em que houve um aumento de nove por cento de infracções à Lei do Trânsito que entrou em vigor no dia 1 de Outubro. Para Luís Correia Gageiro, tal não reflecte uma deficiência na redacção da lei, porque no início os cidadãos estão sempre mais alerta. “Lentamente, as pessoas vão-se esquecendo”, acrescentou.
Mesmo assim, não se revela insatisfeito. “Faço um balanço positivo, tendo em conta que, desde a aprovação na Assembleia Legislativa, houve uma campanha intensiva, a cargo dos profissionais ligados ao tráfego, da qual decorreu uma boa aceitação”, esclarece. Ou não tivesse deixado de ver, nas primeiras páginas dos jornais, acidentes de extrema gravidade, afirma. E é por isso que, no cômputo geral, acredita que as pessoas conhecem a lei. “Os acidentes graves podem manter-se em termos estatísticos, mas, em termos de realidade, o aparato desse acidente diminuiu”, declarou. Motivos? Diminuíram os acidentes motivados pelo consumo de álcool e pelo excesso de velocidade. “Já existe uma certa moderação e atenção ao mote ‘se conduzir não beba’”, acrescentou.
No que toca ao álcool, o chefe dos Serviços de Viação e Transportes relembrou as acções de fiscalização a cargo das autoridades policiais. Quanto ao excesso de velocidade, “o departamento de Obras Públicas e Transportes já instalou, e pretende instalar mais, câmaras de videovigilância em certos pontos negros – locais em que existe uma tendência para o condutor ultrapassar o limite estabelecido”, declarou. É o caso da Avenida da Amizade, de Pac On, de Coloane. Vias que “oferecem mais condições para acelerar”.
E o estacionamento ilegal? Com o aumento do número e montante das multas passadas aos condutores, e a reivindicação por parte destes de que não existem lugares suficientes de estacionamento, Luís Gageiro alerta para duas distinções. “Por um lado, existe a lei que vai regulamentar o tráfego. Por outro, as infra-estruturas existentes”, afirma. Realçando o trabalho da Administração “em minimizar o impacto, criando mais lugares para estacionamento”, o responsável afirma que, no que toca aos motociclos, a “meta passa por criar mais 10 mil postos de estacionamento”. Do lado dos veículos ligeiros já não quis adiantar pormenores, por tratar-se da competência do departamento das Obras Públicas, não deixando, contudo, de referir os “silos para automóveis em construção ou que já foram construídos”.
Contudo, constatando que muitas vezes os silos de motociclos “não estão tão ocupados como deviam”, o responsável considera que as pessoas deviam perder mais tempo a estacionar. “Pode ser um pouco mais longe, mas as pessoas não podem querer ter sempre as coisas mesmo à porta de casa”.
Com Macau actualmente a possuir parquímetros de duas e cinco horas, Luís Gageiro deixou no ar uma novidade. Uma eventual criação de parquímetros digitais, que permita usar o parque por mais tempo, usando um cartão”. Pormenores não adiantou por, mais uma vez, o assunto estar sob a alçada do departamento das Obras Públicas e Transportes. Procurando confirmar o avançado, o Tai Chung Pou, não conseguiu, contudo, obter declarações por parte dos serviços competentes.
Recorde-se que, em Outubro, registou-se um decréscimo de quase dois terços no que toca ao número de transgressões detectadas pelas autoridades, mantendo-se idêntico o número de acidentes em comparação com os meses anteriores. De acordo com os dados oficiais revelados pelos Serviços de Estatística e Censos, registaram-se 17.761 infracções às leis do trânsito, o que representa uma diminuição de 64 por cento face aos números registados no mês imediatamente anterior. Em comparação com o período homólogo de 2006, a quebra é similar - 58 por cento.
Contudo, após a quebra registada no primeiro mês em vigor, apresentados já os resultados em Novembro, alterou-se esta tendência. De acordo com dados oficiais divulgados na passada sexta-feira, no mês passado registaram-se 19.725 infracções à Lei do Trânsito, o que representa um aumento de nove por cento face ao mês antecedente. No que toca aos casos de excesso de álcool, verificou-se também um acréscimo das infracções, que passaram de 59 em Outubro para 69 em Novembro, com a maioria dos casos a envolver taxas de alcoolemia superiores a 1,2 gramas de álcool por litro de sangue. Mas o maior número de infracções pertence ao estacionamento ilegal, tendo sido detectados 16.776 casos. Foram ainda detectados 20 casos de utilização do telemóvel durante a condução e três situações de não utilização do cinto de segurança.
O que ainda falta
Realçando como “ponto forte” as alterações aos comportamentos dos condutores, o chefe dos Serviços de Viação e Transportes do Instituto para Assuntos Cívicos e Municipais (IACM), Luís Gageiro, não deixa de referir aquilo que considerou ser um “ponto fraco”: “a Lei do Trânsito Rodoviário não foi aprovada em conjunto com outros regulamentos”. E é por isso que, dois meses depois, ainda falta aprovar “perto de quarenta itens que serão distribuídos por quatro grandes regulamentos”.
Frustrando as expectativas das pessoas, que “estavam à espera de um conjunto de normas que devia sair em simultâneo”, os tais diplomas complementares deverão começar a ser apresentados ao público no próximo ano. “São assuntos que necessitam de mais investigação. A pouco e pouco serão introduzidas essas alterações”, explica.
Prevendo-se “quatro grandes diplomas”, que serão “o regulamento das sinalizações, o regulamento de homologação dos capacetes, o regulamento das escolas de condução e o regulamento dos táxis”, Luís Gageiro hesita em avançar com datas. Mas deixa no ar: “o que está mais avançado é o dos táxis, que será introduzido em breve”. Para o próximo ano está prevista a apresentação do regulamento dos capacetes. “Quanto aos outros, deverão aparecer apenas numa fase posterior”, acrescenta.
Contudo, adverte, não existe qualquer lacuna. Apenas uma “desactualização da legislação”. No que toca aos assuntos que deverão constar dos “diplomas complementares”, todos estão “regulamentados, mas não tão actualizados”. Citando um exemplo, Luís Gageiro nomeou os capacetes cujo diploma em vigor data dos anos 90. E face à evolução tecnológica no fabrico dos automóveis, há que introduzir “novos parâmetros”. Recordando o caso de alguns sinais de trânsito, amplamente utilizados em vários países, mas que ainda não são usados em Macau, realçou que há que mudar este panorama. “Por exemplo, pretendemos criar sinais de reboque de veículos que ainda não existem na RAEM”, exemplificou. Quanto a novidades destes diplomas, não quis adiantar. “Ainda está em estudo. Vai ser criado um grupo de trabalho de pessoas ligadas à matéria”, explicou.
E a anunciada Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT)? Um organismo que teria a seu cargo a gestão dos assuntos inerentes ao trânsito rodoviário, sob a tutela do secretário para os Transportes e Obras Públicas, que já estava previsto nas Linhas de Acção Governativa (LAG) para 2005, tendo sido novamente referido nas LAG para 2008. “Ao certo, não sei para quando. A população está à espera. Vejo vantagens em criar essa nova direcção, dado que actualmente as competências estão repartidas por vários serviços, concentrando-se ali todas as matérias”, afirmou. Não avançando quem poderá integrar este organismo, apenas declarou que “o IACM foi consultado para o integrar, bem como o departamento das Obras Públicas”. Mas salientou que os trabalhos “já se encontram numa fase bastante avançada”.
Recorde-se que, em Maio do ano passado, o Governo abriu as propostas do concurso para a construção do edifício da DSAT, que ficará situada em frente à sede da CEM - Companhia de Electricidade de Macau. O prédio terá 22 andares, compreendendo nos primeiros três um parque de estacionamento público, com capacidade para 100 carros e 200 motociclos. No segredo dos deuses está o nome de quem ocupará esse edifício.
Um ponto não foi explorado por esta Lei do Trânsito Rodoviário. Em média, um examinando tem de esperar dez meses para realizar o exame prático de condução. “O maior factor que agravou o período de espera é o aumento do número de candidatos. Já solicitámos autorização para ter mais inspectores, mas tendo em conta que o nosso centro de exames é pequeno – e também é de aprendizagem – vai levar tempo até encurtar essa espera”, alerta. Uma questão que ficou de fora da Lei do Trânsito Rodoviário, e que não deverá também constar dos diplomas complementares.
Luciana Leitão
Um ponto agradável no centro da Ásia. É assim que os residentes brasileiros descrevem o território. São cerca de três centenas os cidadãos oriundos de Terras de Vera Cruz. Ao contrário das grandes cidades do Brasil, Macau tem menos tráfego rodoviário e é um local mais sossegado para viver, dizem.
No entanto, poucos planeiam permanecer e criar raízes. Muitos estão ligados a actividades que exigem “andar com a casa às costas”. A par de todas as outras comunidades lusófonas da RAEM, os residentes canarinhos estão associados a grupos profissionais muito específicos. A maioria é formada pelo “pessoal da aviação”. Depois há as bailarinas, os missionários religiosos, as pessoas contratadas por empresas privadas e alguns são funcionários públicos. Habituados ao corre-corre das suas cidades natais, os brasileiros chegam à região e espantam-se com a diferença de atmosfera que aqui encontram.
“Macau é um paraíso em termos de segurança”, exclama Jane Martins, funcionária bancária residente no território há 22 anos. A criminalidade é um dos estigmas do país da América do Sul. Caminhar nas ruas sem olhar constantemente por cima do ombro é um dos factos mais apreciados pela população brasileira estabelecida na região.
Jane Martins chegou ao território numa altura em que os seus compatriotas não ultrapassavam o número 20. A RAEM tornou-se a sua segunda casa por força do casamento. Hoje, é uma das principais representantes desta comunidade lusófona no território. É a responsável pela famosa barraquinha da caipirinha na Festa da Lusofonia e a “segunda cidadã com mais anos de residência em Macau”, afirma.
Quem chega pela primeira vez “corre” para falar com Jane. “Dizem que sou como a mãe deles. Muitos me procuram para eu os ajudar a resolver aqueles problemazinhos iniciais, como encontrar casa”, conta. A brasileira não é apenas um dos portos de abrigo dos recém-chegados, é uma enciclopédia sobre a comunidade brasileira residente no território, visto que lida de perto com os seus problemas e necessidades.
Um dos aspectos que distingue este grupo das outras comunidades lusófonas é que não tem uma organização própria. Em tempos, existiu, porém, uma Associação Sociocultural e Desportiva Brasil Macau que só esteve de pé até 1994. “Durou uns dois anos, porque entretanto o presidente foi embora do território e a direcção foi dissolvida”, recorda.
Actualmente, não há ninguém que esteja disposto a responsabilizar-se pela organização, porque, como se diz na gíria brasileira, se trata de um “pepino”. Para formar um grupo deste tipo é preciso ter nervos de aço e Jane Martins está “fora”. “As pessoas andam atrás de mim para criar uma associação, mas eu não quero, porque geram-se sempre alguns conflitos e confusões por um ou outro motivo”, aponta.
Mais do que uma associação, a responsável considera que a comunidade carece de uma representação consular. Sempre que é preciso tratar de alguma burocracia, os residentes brasileiros são obrigados a deslocar-se ao Consulado-geral de Hong Kong. “Lá não funcionam ao sábado e temos que faltar um dia no emprego de propósito. Já falei mil vezes para eles enviarem algum representante à região, nem que seja duas vezes por semana, mas eles só dão desculpas”, lamenta.
Não é fácil juntar a população brasileira com o objectivo de criar um grupo reconhecido legalmente também devido às exigências das profissões. O grosso dos residentes brasileiros está ligado à actividade de aviação. São pessoas contratadas por períodos de quatro anos que trazem a família, mas que não se radicam na RAEM com um objectivo de permanência. Além disso, “estão sempre a viajar e têm falta de disponibilidade”, acrescenta.
“Na verdade, os pilotos não têm muito tempo para se dedicar a uma associação. Nas folgas, é a família que tem prioridade”, explica Décio Martinelli, funcionário da Air Macau. O residente é um dos cerca de 50 elementos da “turma” ligada à companhia aérea. Há sete anos a viver em Macau, o piloto representa uma excepção no contexto da comunidade.
“Faço parte do grupo que aguarda uma promoção na transportadora. Nem pretendo ir embora tão cedo”, frisa. Nas palavras de Décio, não há destino melhor na Ásia para os brasileiros do que a RAEM. Trata-se de uma questão não só de língua, mas também de qualidade de vida. “Em São Paulo, há muito trânsito e confusão. Macau é uma cidade muito gostosa”, observa.
Roberval Silva, professor de Linguística e Língua Portuguesa na Universidade de Macau, considera que é muito fácil criar um fascínio pela região. Mudou-se para cá “por conta” de um trabalho para a tese de doutoramento e foi recebido “de braços abertos”, tanto em termos profissionais como pessoais. A ausência de uma associação não é algo que lhe tire o sono. “A comunidade é pequena e não está muito interessada em estabelecer-se. Às vezes acaba por permanecer 15 anos, mas sempre com a perspectiva de que não vai ficar”, aponta.
Nos últimos anos, o número de cidadãos brasileiros tem aumentado consideravelmente no território e o desenvolvimento económico tem sido o principal motivo. De acordo com os registos do Consulado-geral do Brasil em Hong Kong, há cerca de 200 cidadãos canarinhos a viver em Macau. Isto sem contar com os elementos que não estão registados. Pelos cálculos de Jane Martins, a população brasileira da RAEM ascende aos 300 residentes.
“Se o grupo vai crescer? Ai eu acho que vai. Isso vê-se pelo jeito que eles estão a ser requisitados para os casinos”. Para a responsável, a tendência é sempre para este número se multiplicar, nunca para diminuir, especialmente com a máquina do sector do entretenimento a reclamar mão-de-obra qualificada.
“A marca Brasil está a vender mais do que nunca no território”, revela o proprietário do Grupo Dança Brasil, Wallace da Silva. Com a abertura dos novos empreendimentos turísticos na RAEM, o empresário não tem mãos a medir para tanta solicitação. “Os chineses adoram a alegria das danças brasileiras e ficam malucos com os brilhos das nossas fantasias.”
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